quarta-feira, 28 de abril de 2010

Quem cuida de quem cuida de crianças?



Estamos longe dos tempos em que as mães cuidavam de suas crianças durante as vinte e quatro horas do dia. Hoje elas trabalham fora de casa, viram-se em duas pra dar conta de tudo o que tem que fazer e as crianças, em grande parte, são cuidadas por cuidadores. Ainda há as mães e pais que ficam em casa, mas, ainda assim, as crianças são levadas para escolinhas e creches bem cedo.

Pode-se arriscar dizer que a maioria das crianças são cuidadas por cuidadores, portanto.

Mas, será que essas pessoas que assumem o encargo de cuidar de pessoas em desenvolvimento estão capacitadas devidamente para tão grandiosa missão? Será que elas estão aptas a amar e proteger de forma adequada?

Temos notícia nos últimos dias de casos de tortura contra crianças bem pequenas, vitimadas por pessoas que, desequilibradas, foram notícia de jornais e TV. Para as autoridades que lidam todos os dias com crimes contra crianças, isso não é novidade, pois recebem, de forma assustadora e crescente, denúncias de maus tratos, estupros e todos os tipos de violação de direitos, por parte de adultos, na maioria das vezes adultos da própria família.

Cabe-nos proteger nossos filhos e filhas, mas não só isso, cabe-nos cuidar de todas as crianças. A perda e a violação de uma criança é irreparável e depõe contra a nossa humanidade. É intolerável a omissão e a ignorância quando se trata de proteger a infância.

Esses casos notórios e ostensivos, por vezes, não nos deixam ver as pequenas crueldades que acontecem e que, por não estarmos preparados, deixamos acontecer. Quantas vezes vimos crianças serem surradas, até mesmo espancadas e ficamos quietos? Quantas vezes vimos meninos e meninas serem insultados por adultos? Quantas vezes vimos crianças serem vitimadas por outras crianças e pensamos que fosse normal? Se olharmos pra dentro de nós, talvez nos lembremos da nossa infância, das vezes em que riram das nossas gafes, das vezes em que gritaram conosco, das vezes em que bateram em nós e de quanto isso nos fez sofrer. Talvez nos lembremos dos apelidos que botamos nos nossos colegas, rimos deles e isso nos fez sofrer também.

A infância deve ser um tempo cheio de alegria, de aprendizado, de descobertas, de carinho. A atuação dos adultos deve ser estimulante, exigente com relação às boas maneiras e para isso eles devem ser respeitáveis, equilibrados e, principalmente, disponíveis. O abandono também se caracteriza quando os adultos são indiferentes e relapsos.

Cuidar de crianças não é tarefa para todos, pois dá muito trabalho, exige atenção em tempo integral e, mais importante, exige preparo. Nem todas as pessoas estão preparadas para algo tão absorvente. Sentir-se gratificado no final do dia por ter respondido mil perguntas, por ter ajudado a andar, por ter ajudado nas tarefas da escola, por ter cuidado dos machucados, por ter tranqüilizado, por ter dito mil vezes a mesma coisa, é a melhor coisa do mundo. Mas, estamos nos sentindo assim? Ou descobrimos falhas onde não podemos falhar?

Há que cuidar dos adultos para que eles cuidem adequadamente das crianças. Este é um desafio que não tem tamanho, gente!


Publicado no Diário da Manhã em 30/04/2010

3 comentários:

Unknown disse...

"Sentir-se gratificado no final do dia por ter respondido mil perguntas, por ter ajudado a andar, por ter ajudado nas tarefas da escola, por ter cuidado dos machucados, por ter tranqüilizado, por ter dito mil vezes a mesma coisa, é a melhor coisa do mundo."

E como é!

Ótimo texto e ótima causa!

Bjs =***

Gabriel P. Knoll disse...

Olá Sueli,

este é um problemão! Mas, se caso nosso país nao foste este de zilhões de filhos por casais desestruturados ou com nenhuma/pouca capacidade de cuidar das suas crianças, os empregos seriam para aquele que gosta de tal atividade. Somente aqueles que fizessem por gosto estariam ali, não os que fazem por sobrevivência.

Não que eu tenha sido um super professor. Mas nunca precisei da miséria do Estado pra sobreviver, e isto me dava uma perspectiva diferente dos que tinham a obrigação de dar aula pra se sustentar no final do mês.

Se deixarmos as atividades para aqueles que são competentes, isto seria caso isolado!

Abçs
Gabriel

Sueli disse...

È Gabriel! Ser professor de crianças, coisa grandiosa e super absorvente e ganhar pouco, deve ser uma barra. Quando eu era criança, professor tinha status e podia trabalhar só um turno e as professoras tinham empregada para cuidar da casa. Eram portanto mais disponíveis. Imagina hoje, como pessoas especiais como são os professores podem ter a sensibilidade necessária para o cuidado integral? Gostei do comentário, que é muito pertinente. Obrigada!