quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

Suspiros!


Aprendi a fazer suspiros! Este era um tabu que demorei muitos anos para resolver, pois não conseguia assá-los convenientemente. Agora eu sei que devo deixar o fogo bem baixinho e colocar a parte de baixo da manteigueira de inox entre a porta do forno e o forno, de forma a mantê-lo sempre entreaberto. E zás! Lá estão meus suspiros com nozes, lindos leves e soltos, como sempre almejei e sempre comi com voracidade, feitos pelas minhas cunhadas. Agora sim, os ovos serão aproveitados em sua totalidade, exceto as cascas. Elas sempre podem ser misturadas à terra, dizem, para fazer compostagem, e, como não faço compostagem, elas vão diretamente à lata de lixo orgânico. Tenho mania de separar os lixos, mas sei que tudo é bem misturado por essa empresa que nos impingiram, que finge fazer um serviço, e nós fingimos que acreditamos. Vi no Bourbon, vários recipientes para reciclagem de lixo e entre eles, há um que recolhe pilhas usadas. Eu adorei, pois estou com um estoque de pilhas que acredito serem muito danosas ao planeta, se jogados por aí, nos lixões. Enfim, venci uma etapa culinária e estou feliz por isso. O Domingos vai se refestelar comendo essas bolinhas brancas e açucaradas, que são a paixão dele. Para quem não sabe, misturar nozes picadas à merengada é tudo de bom...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Cozinhando

O Natal está chegando e eu estou cozinhando. Faço-o enquanto penso no gosto dos meus queridos, tentando agradar a todos. Papo de anjo é uma unanimidade, portanto fiz muitos e ainda farei outro tanto. Vou mandar as claras para a Iria que sabe fazer merengues com nozes, uma delícia sem par. Sou péssima pra fazer merengues, mas meus papos de anjo... Eu poderia ser uma portuguesa, tal a facilidade com que os faço. Penso muito nos portugueses e nas delícias que nos legaram, feitos basicamente de ovos e açúcar. Claro que de farinha também, ou não teriam criado os pastéis de Santa Clara. Amo a textura dos doces portugueses, por sua leveza e simplicidade, pois tudo se desmancha na boca. Ainda vou fazer uma pesquisa bem séria e me especializar em transformar ovos em algo quase etéreo, inacreditável. Cozinho enquanto espero a Flávia, com uma saudade que não tem nome, tal a intensidade. Perdi os cantinhos que permaneciam com o cheirinho dela, por causa do tempo e o tempo se encarrega de apagar o que não é frequentado por um tempo. Ela levou quase tudo embora e o que ficou foi se tornando algo pertencente à casa, sem suas características, sem seu cheiro. Espero que daqui a alguns anos, meus filhos procurem o cheiro da casa deles, por sentirem saudade de nós. Enquanto isso, vou fazendo quitutes e procurando reunir todos em volta da mesa.

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009


Ciudades sensibles I

Cuestiones (abiertas) sobre ciudades sensibles


- Primera entrega -


Por: Leopoldo Fidyka (*)


“Ciudad sensible, no es la de bellos edificios sino aquella más cerca de los corazones...”




Estructuramos nuestra vida en ciudades, ellas son nuestra casa, nuestro espacio común, lo que nos lleva a la urgente necesidad de repensar nuestra forma de abordarlas, vivirlas, gestionarlas y planificarlas.

Quizás falte algo, quizás se necesite exteriorizar e incorporar los sentimientos: Ciudades sentidas, ciudades que sientan, ciudades que permitan sentir.

El pensamiento por una ciudad mejor, no es nuevo aunque la temática en los últimos años tomo una singular trascendencia.

Ya desde antigüedad surgió la búsqueda por la Ciudad Ideal en procura de las características que debía reunir una ciudad para el desarrollo de los hombres teniendo en cuenta su bienestar físico y sus necesidades sociales.

Desde distintas perspectivas y contextos como Platón, Vitrubio, Al Farabí, Leonardo Da Vinci, Tomás Moro, Le Corbusier, entre muchos otros, reiteran su preocupación por este aspecto, sin embargo, los años pasan y los problemas se acrecientan, por lo que algo estamos haciendo mal, las ciudades permanentemente vienen reproduciendo muros, barreras (espaciales y físicas), degradaciones, desigualdades y exclusiones.

Pero llegamos a este punto, quizás por varios sesgos culturales[1], los cuales serán importante tener en cuenta para hacer efectivo el pleno ejercicio de los derechos humanos y la ciudadanía en clave sensible.

. El individualismo, “del sálvese quien pueda” que deja afuera la solidaridad y la construcción colectiva.

. El racionalismo, como única fuente de entrada para abordar y comprender los fenómenos.

. El antroprocentrismo, de ver al hombre como dueño de la naturaleza, que llevó a atrocidades contra el ambiente y nosotros mismos.

. El economicismo, que solo valora lo medible o redituable desde el punto de vista material.

. La representación "formal" de la democracia como delegación "abstracta", donde se incluye también a los marcos normativos.

. El sesgo masculino-patriarcal de la sociedad contemporánea.

Es decir, el pensamiento fragmentado, instrumental nos llevó por caminos alejados de la sensibilidad. Si entendemos por sensibilidad la facultad de sentir algo, la capacidad de respuesta o la inclinación a dejarse llevar por los sentimientos, llevado esto, al plano exterior o urbano, ciudades sensibles serían ciudades que sienten, ciudades que perciben o incorporan los sentimientos, o ciudades que permiten o facilitan expresarlos.

Se generan “de adentro hacia fuera”, dado que intenta explicitar los sentimientos más sublimes de los seres humanos; “de abajo hacia arriba”, porque se despliega desde la misma ciudad; “de aquí al mundo y del mundo hacia aquí”, porque integra la relación global-local y viceversa, pone en consideración la búsqueda en la identidad pero sin resignar a la apertura y la diversidad cultural.

Una ciudad sensible no permite el sufrimiento, la degradación ambiental, social y cultural. Se piensa con clave de género y de igualdad de oportunidades e integra al todo y a las partes.

Sería una ciudad educadora, saludable, creativa[2] (por eso resultan valiosas las iniciativas que en este sentido se vienen intentando en ciudades de distintas partes del mundo) pero la ciudad sensible debe ir mucho más mucho más allá, por lo tanto también, deberá ser solidaria y afectiva.
Por lo tando se distingue de las demás ciudades y redes que pone su eje en la alteridad, en los encuentros, en los afectos y en la alegría, pero lejos de ser un concepto cerrado, la ciudad sensible, es una idea abierta, progresiva y en construcción.


Continuará...




[1] Más sobre el particular en “Formación en Cultura Democrática”, de Elizalde, Antonio y Donoso, Patricio: documento presentado por los autores en el 1er. Seminario Nacional de Formación Artística y Cultural organizado por el Ministerio de Cultura y realizado en Santafé de Bogotá del 27 al 29 de julio de 1998.

[2] Existen redes internacionales de ciudades educadoras (Asociación Internacional de Ciudades Educadoras AICE) impulsada por el Ayuntamiento de Barcelona cuya sede en Argentina es Rosario; Municipios y comunidades saludables OMS/OPS; y Ciudades Creativas UNESCO.




(*) Abogado y magíster en Dirección y Gestión Pública Local. Proyecto Casa Warat Buenos Aires


Extraído do blog Casa Warat

Podemos comemorar o Natal, sim!



Desde a idade média comemoramos o Natal, a festa maior do ocidente. É impossível ficar indiferente ao clima natalino, por vir carregado de uma atmosfera de boa vontade, de perdão, de troca e de algumas chatices, convenhamos.

Ao relembrarmos o nascimento de Jesus, revisitamos seu legado filosófico e pacificador. Mesmo quem não é religioso, mesmo quem não acredita na divindade de Jesus, curva-se ante a sabedoria latente e sempre atual contida nos evangelhos.

Deve ser por isso que todos nós, salvo raras exceções, continuamos a enfeitar a casa, ano após ano, continuamos fazendo das tripas coração para reunir a família e continuamos fazendo comidas gostosas no intuito de compartilharmos mais um ano de nossas vidas.

A pontinha de melancolia que nos acomete nesta época só pode ser explicada, na medida em que temos consciência de que os ensinamentos de Jesus não foram realizados em sua totalidade. Sabemos que sua linda mensagem ainda não nos tornou fraternos o suficiente, pacíficos o suficiente, humanos o suficiente.

Como podemos comemorar o Natal com plenitude, se sabemos de uma criança perfurada por dezenas de agulhas, pois foi submetido a um ritual religioso? Como podemos saborear nossas comidinhas sem que lembremos que milhões de pessoas ainda passam fome? Como podemos abraçar nossos familiares se não conseguimos alcançar os que moram nos esgotos, em prisões superlotadas e fétidas, sob pontes barulhentas? Como podemos trocar presentes se há crianças esperando um Papai Noel que nunca chegará?

Todas essas perguntas remetem-nos à ciranda de corrupção que faz girar vertiginosamente um grande número dos nossos políticos, que oram e riem, enquanto sugam o dinheiro público, feito vampiros que se alimentam do sangue de um povo.

As religiões fracassam ante atos tão escandalosos em nome de alguma divindade, ante pessoas que oram enquanto enfiam dinheiro público em cuecas e meias. Nós todos fracassamos quando, enganados, reelegemos corruptos, num ato cuja responsabilidade é dos candidatos, pois sabem enganar-nos e induzir-nos a acreditar neles de novo, dando-lhes um mandato que deveriam honrar.

O Natal deve ser de esperança e não podemos desistir de aprender com Jesus, que nos ensina sempre a sermos fraternos, livres, comprometidos uns com os outros. A intenção de Jesus ao falar com o povo, não foi a de submetê-lo e torná-lo resignado, esperando que seu sofrimento seja recompensado no céu, mas ensinou-nos a ter altivez e capacidade de combater as injustiças.

Podemos comemorar, sim, desde que, em meio aos abomináveis fogos e rojões, tomemos a decisão de melhorarmos nossas relações com nossos queridos e com o resto da humanidade.



Publicado no Diário da Manhã de 14/12/2009


terça-feira, 8 de dezembro de 2009

A Pedra

Quando o Bruno era bem pequeno, ainda no ensino fundamental, a escola propôs a ele e a seus colegas uma pesquisa sobre pedras. Lá foram o Domingos e ele à cata de exemplares de pedras, em marmorarias, em pedreiras, no quintal e, lógico, em Soledade. Eis que o Bruno, bem embasado com leituras e pesquisas, descobriu que um certo tipo de pedra possuía poder curativo.
Nesta época, minha mãe estava sofrendo dores muito fortes por causa de uma úlcera na perna e não encontrávamos nada que a pudesse ajudar efetivamente. Eis que o Bruno colocou uma pedrinha preta em cima do telhado, deixou-a lá ao sol por um tempo e a levou para a avó, com a recomendação de que só ela a tocasse. Por muitos dias, na hora de tirar o pó da máquina de costura onde a pedra foi colocada, a pessoa que o fizesse chamava minha mãe para que ela mesma a pegasse e a recolocasse no lugar.
Não sei se a pedra ajudou, mas o elo de afeto que isso produziu foi algo inesperado e emocionante. Todos os dias o Bruno subia e perguntava se a avó havia melhorado e, invariavelmente, a avó respondia que sim, que a pedra estava ajudando muito.
Coisas simples dão colorido ao nosso quotidiano, desde que tenhamos sensibilidade para aproveitar tudo o que nos aproxima. O amor é feito disso e de mais nada!

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Companheiro

Ter um marido como o meu é muito bom. Há momentos em que necessitamos dizer coisas inimagináveis sobre a vida, sobre as situações, até como forma de desabafo. Eu digo ao meu Mingo. E ele entende. E não critica. Ouve e sorri daquele jeito carinhoso de quem já tem duzentos anos de compreensão do mundo. Seu temperamento sereno é um contraponto ao meu, o que é muito bom, tranquilizador. Sei que ele tem os mesmos sentimentos de todos nós, isto é, raiva, ódio, insegurança, carências, mas, o amor nele é muito maior que tudo. Com relação aos filhos que aprontaram como todos os filhos aprontam, ele soube responsabilizá-los firmemente, mas sem o menor ressentimento, sem a insegurança típica que nos assola, do tipo, o que eu fiz pra merecer isso, ou, onde foi que falhei. Ele não, sua segurança de que tudo daria certo nortearam sua conduta de educador. Ele nunca duvidou da linha que adotou e as falhas que aconteceram ele encarou como inerentes e necessárias ao processo. Agora que estou vulnerável, ganho dele a serenidade de que preciso, ganho a confiança de que amanhã será melhor. E com ele será sempre muito melhor do que está sendo. Não me sinto um complemento dele, nem ele é meu complemento, somos somente duas pessoas diferentes que se amam profundamente.

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Ansiedade

Tenho suportado bravamente um mal-estar que me atormenta. Quem me conhece pergunta invariavelmente o que me falta e por que estou tão ansiosa. Não consigo responder, o que me torna uma pessoa privilegiada, porém profundamente afetada por sintomas que reputo insuportáveis. Acordar no meio da noite com sensação de morte, sem capacidade de dar um passo, sentindo a boca seca, as extremidades amortecidas e um turbilhão concentrado no meio do peito, é algo que me amedronta. Esse turbilhão, parecido com água em movimento é o grande pavor de um quadro desses. Tem-se a nítida sensação de estar tendo um ataque cardíaco. A consulta ao psiquiatra é imperativa, já que não há como escapar de tomar remédios. Sei que terei que me submeter a uma psicoterapia, com todos os requintes de abrir porões, baús e gavetas emocionais. Imagino-me sentada de novo, tentando desvelar minha alma para uma pessoa desconhecida, porém super preparada para encarar o torvelinho de angústias e situações mal resolvidas que ficaram lá no passado e que, subitamente surgem e mostram que o bicho não é tão feio quanto a minha imaginação elaborou. A cada sessão deixa-se algo que já morreu dentro do consultório e isso nos liberta aos poucos. Por vezes deixei vários cadáveres que eu imaginava ficassem lá, sólidos a ponto de ocuparem um espaço. Com o tempo entendi que a sensação de deixar algo para trás, dizia respeito ao alívio de ter abandonado algo que me incomodava e que só ocupava um espaço incômodo dentro de mim. Mas, abandonar antigas crenças, antigos fantasmas é traumático. O que me impede de correr de novo ao consultório da minha psicóloga é o medo de deparar com coisas de que não gosto de lembrar, com o trauma de ter que purgar algo que faz parte de mim a tanto tempo, que pensava fosse normal ficar grudado à minha maneira de ser. Penso que ser livre é alguma forma de auto perdão, é alguma forma de perdoar e elaborar o passado e para isso preciso de ajuda. Meus porões, minhas gavetas e baús já não estão mais tão atulhados, mas estão merecendo uma boa faxina.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Ah, as mulheres!

“Antigamente (isto acontecia antes do Cristianismo), depois do casamento, o homem tinha o poder sobre a vida e a morte de sua esposa. Ela não poderia recorrer a nenhuma lei contra ele: ele era o único tribunal e a única lei para ela.” ...”algumas pessoas têm consciência da enorme infelicidade produzida, até mesmo nos dias atuais, pelo sentimento de uma vida desperdiçada.” Stuart Mill – A Sujeição das Mulheres (1869)

Stuart Mill escreveu a obra na esteira de um movimento do final do século XVIII, fruto da Revolução Francesa. A partir daí houve muita produção intelectual, elaboração de leis em favor das mulheres e, mais importante que isso, propiciou uma mobilização por parte das próprias mulheres pela sua emancipação e pela equiparação de seus direitos em relação aos homens.

Pois, esta semana, vê-se mulheres exigindo o fim da violência contra elas, mostrando que o espírito retratado na frase de Mill continua norteando nossas relações de gênero.

Ao reivindicarem horário integral para o funcionamento da delegacia da mulher, e não uma delegacia de mentirinha, um centro de ajuda, cursos profissionalizantes para que as mulheres se tornem autônomas e aptas a viver sem seu agressor, abrigo seguro para as que corajosamente fazem denúncia contra seus companheiros, equipe que as ampare e cuide para que recobrem sua auto estima, elas estão exigindo os direitos já há muito positivados, inclusive obtiveram a maior conquista social sobre o tema, a promulgação da Lei Maria da Penha.

Comove-nos a proposição dessas intrépidas mulheres de que os agressores sejam tratados, por acreditarem que eles mesmos estão doentes. Só mulheres engajadas, bem informadas e tomadas de um profundo senso de humanidade, são capazes de enxergar o que para o senso comum é um paradoxo. O senso comum vê na punição a única forma de corrigir os crimes e os erros cometidos, mas, existem muitas pessoas que compreendem que o ser humano merece ser cuidado em sua integralidade, merece ter a chance de corrigir seus erros e de ser educado de forma adequada para que, com uma nova visão de mundo não volte a fazer vítimas. A punição por si só não educa, mas reproduz a violência.

As reivindicações das mulheres que lutam pelo fim do silêncio, pelo fim da indiferença, pelo direito inalienável que todas as pessoas têm a sua integridade física não são difíceis de serem atendidas. Desde a Revolução Francesa (1789) já aprendemos muita coisa, só não aprendemos a usar o dinheiro público para o bem estar das pessoas, só não sabemos salvar pessoas com nossas leis, mas protegemos muito bem o patrimônio.

Nossa solidariedade para com o Movimento de Mulheres é pouco. Devemos também educar nossos meninos e meninas de forma a termos lá adiante a concretização dos ideais: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tão caros à Revolução Francesa. Ver fotos de mulheres amordaçadas, denunciando que ainda há quem acredite ter dono, e que há quem acredite ser dono de alguém. É de doer!


Publicado em Zero Hora no dia 28/11/2009

Publicado no Diário da Manhã de 01/12/2009

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Comunicador apoplético, furioso!

Recebi várias vezes o mesmo e-mail contendo a manifestação de Luis Carlos Prates, intitulado Pedagogia da Cinta. Pois bem, poucas vezes dou importância exagerada ao que recebo pela internet, mas, desta vez, fiquei extremamente preocupada.
Demorei para acreditar que um comunicador, um formador de opinião, fosse capaz de se referir a seus semelhantes com tamanha falta de respeito. Não consigo me calar quando vejo alguém chamar criança de pivete e ainda por cima, recomendar que se use a cinta para castigá-la. Ele começa seu desrespeitoso discurso, falando que um jogador de futebol que ouse dar uma bofetada no juiz, será punido exemplarmente, respondendo em juízo pelo que fez. Ao referir-se aos professores que, segundo ele, estão indefesos nas mãos de seus alunos pivetes, ele chega ao requinte de dizer: "... desde quando criança tem opinião?". Para ele as crianças devem ser castigadas com cinta pelos seus pais, para que aprendam a ficar calados e obedientes. Diz também, pasmem, que pivete agora é chamado de hiperativo e que pedófilo agora é considerado doente.
O sr. Prates ignora que vivemos uma outra era, na qual a ciência recomenda que se cuide da criança de forma respeitosa, para que consiga conduzir-se de forma pacífica e adequada. Não é do desconhecimento de ninguém, que a maioria das crianças não são sequer olhadas pelos adultos, nem pelos seus pais. Não ignoramos o abandono em que vivem, tendo pais indiferentes e ocupados com suas próprias vidas, enquanto os professores tentam compensar essa ausência, gerando uma sobrecarga difícil de carregar. O que temos são crianças que, ao invés de chamadas de pivetes, ao invés de castigadas com cintas, deveriam ser cuidadas amorosamente pelos adultos responsáveis por elas. Não conheço uma criança cuidada com amor e responsabilidade que tenha se tornado violenta. O contrário todos nós conhecemos. Aquele pedófilo a que o nervoso comunicador se refere, esse sim foi abusado e espancado quando criança, o que explica em parte seu comportamento predador.
Está doente alguém que ignora as tentativas mundiais de pacificação, que ignora o exemplo de Gandhi, que ignora que uma cultura de surras de cinta produz crianças amedrontadas, incapazes de se defenderem de pedófilos, por temerem a reação dos que os espancam; está doente quem usa de bancadas de comunicação de massas para insuflar a violência contra crianças, chamando-as por nomes que as desqualificam como cidadãos de direitos que realmente são.
Esperemos que, caso a jornada de trabalho seja reduzida no Brasil, os pais tenham tempo de dizer à sua criança: "hoje vamos à escola com você, conversar com sua professora que você ama tanto." Isso sim seria uma ação positiva, isso sim é pacificador.
Quanto à recomendação do uso da cinta, experimentemos usá-la em nosso cão, para ver se não seremos denunciados na mesma hora, com razão, aliás. Experimentemos usá-la no jogador de futebol a que o comunicador se refere, para ver se não seremos acusados de violência descabida.
Usar de cinta para bater em criança, pode? Que espécie de pessoas somos? Estamos retrocendo para um passado em que criança era propriedade dos adultos, o que permitia que fossem mortos, internados, maltratados pelo trabalho, ou avançando para tempos ainda mais sombrios?
Vale a pena pensar em amor, em cuidado, em proteção, em carinho. Dar beijos e abraços produz milagres. A cinta fica muito bem se afivelada na cintura dos pais.


Publicado em O Nacional de 1/12/2009


sábado, 14 de novembro de 2009

Cidade sensível

Seguindo o raciocínio da postagem anterior, fico imaginando minha cidade com escolas onde as crianças fossem educadas priorizando a sensibilidade. Esta semana, vendo um filme pela tv fechada - sabe aquela que a gente paga e mesmo assim tem propaganda - e fiquei pasma com a constatação de que existe uma experiência nos Estados Unidos neste sentido. Pena que peguei o filme pela metade, estrelado por Antonio Banderas, aquele feioso, que faz papel de professor em uma escola pública violenta. Ele começa um trabalho com dança e é contestado pelos colegas, que diziam ser perda de tempo e de dinheiro. Em dado momento, ele explica que a dança trabalha valores, pois, quando um menino enlaça a cintura de uma menina ele a conduz e a respeita, assim como respeita regras e a disciplina. Segundo ele, a dança melhora a auto estima dos adolescentes, o que ficou evidente quando participaram de um concurso em um baile. O final é emocionante, pois retrata a atitude dos meninos e meninas que não venceram, mas que deram um show de caráter e discernimento, pois se conduziram pacificamente o tempo todo. O filme é uma homenagem ao professor que teve a idéia, que ainda é adotada em várias escolas nos EUA. Adorei!
Esta semana fiquei sabendo que a invernada artística de uma escola estadual foi extinta, o que me entristeceu, pois assisti por vários anos, o quanto a gorotada gostava de dançar.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

Educação erótica

Participei de três cafés filosóficos promovidos pelo Dr. Luiz Alberto Warat, um aqui em Passo Fundo e dois em Buenos Aires. Nas três ocasiões ele mostrou sua preocupação com o descalabro em que se encontram as universidades, que cumprem criteriosamente a proposta cartesiana, ou seja, que produzem conhecimento de forma fragmentada, onde nada dialoga com nada. O que me impressiona no Dr. Warat não é a forma consistente com que critica, mas a solução que ele acredita seja a mais adequada. Discutimos nas três ocasiões o que ele chama de educação erótica, dionisíaca. Ele propõe a sensibilização das pessoas, pressuposto para o que Henrique Dussel chama Alteridade (relação rosto a rosto). A partir do que discutimos e do que aprendi e apreendi, pus-me a pensar na forma como fui educada.
Fui aluna de escola particular de confissão católica, promotora de uma educação vitoriana, moralista e excludente. Fui ensinada que o corpo é a morada da alma, duas coisas completamente diferentes e com objetivos diferentes. O corpo serve para conspurcar a alma e a alma sofre manchas causadas pelo corpo, chamadas pecado. Por causa do corpo, a alma pode ser condenada para toda a eternidade, motivo pelo qual, quanto mais o corpo sofrer, mais será purificado e mais chance terá de um dia ressussitar, juntar-se à alma e subir aos céus.
Aprendi, assim como a maioria das pessoas no ocidente, que nossos desejos, nossos ímpetos, nossas satisfações carnais são condenáveis. O que se conseguiu com esse tipo de educação foi a castração de tudo o prazer físico em favor do que a Igreja impunha como correto e adequado.
Somos pessoas adestradas para servir ao poder, pois, com a promessa de outra vida no céu, induziram-nos à resignação. Isso me faz lembrar de Michel Foucault e seus três volumes da História da Sexualidade, onde, vasculhando a história de uma forma totalmente nova, ele faz um resgate da criação das ciências e da construção da ideologia católica relativa à sexualidade humana. Segundo ele, as ciências e a igreja valeram-se do discurso sobre a sexualidade para produzirem conhecimento e, consequentemente, construírem uma engenharia de poder. Fomos induzidos a falar sobre nossa sexualidade nos consultórios e nos confessionários, tendo como resultado uma produção de verdades e conceitos do que seja "normal" em matéria de sexo. Tudo o que foge desses padrões é anormal, patológico e anadequado.
Das minhas reflexões a partir do Dr. Warat, chego à conclusão que sofri uma educação que Nietzsche chamaria de apolínea e oposta à educação dionisíaca (expressão nietzscheana também), proposta pela escola sensível discutida nos cafés filosóficos.
Estou dando tratos à bola para encontrar uma forma de concretizar a escola surrealista do Dr. Warat, onde, segundo ele, construiremos o que antigamente se pensava ser a vida boa.

sábado, 7 de novembro de 2009

Feira do Livro – um acontecimento!


!

Participar de uma feira do livro é um acontecimento. Encontram-se ali pessoas com os mais variados interesses, desde as que devoram livros até as que estão lá por causa de um único exemplar de que estejam precisando. Há ainda pessoas que, angustiadas, procuram solução para seus problemas entre as letras dos livros de auto-ajuda, ou estudiosos vorazes atrás de livros técnicos com preços mais em conta.

Gosto de ver os garimpeiros, aqueles que fuçam os cestos, lêem lombadas, orelhas e preços, pois nunca levam poucos livros pra casa. Geralmente são curiosos demais, não sabem muito bem o que querem e percorrem tenazmente estande por estande com um sorrisinho característico na boca. Cada achado é uma vitória. E vá fuçar, enquanto acumulam sacolinhas incômodas, que insistem em cortar a circulação dos braços. Esses levam os filhos consigo e trocam idéias com eles, com o intuito de passar adiante a paixão que cada livro desperta. São eles que compram presentes em livrarias, quase nunca em shoppings. São esses os que lêem antes de dormir, não só para que os filhos durmam, mas para servirem de ponte entre as crianças e os livros. Eles sabem que essa atitude significa um legado para o futuro.

Gosto de ver as pessoas que compram ficção, por que essas são empolgadas, enxergam-se nos personagens, elaboram seus conflitos, constroem bases novas para suas vidas. Os romances têm capacidade de proporcionar uma catarse para os sofrimentos humanos, na medida em que retratam uma época, passível de ser transposta para a nossa e projetam sempre um de final feliz.

Amo os relatos de viagens, pois nos transportam para lugares que não conhecemos e a lugares onde já estivemos e para os quais tivemos um olhar diferente. Relatar uma viagem é um exercício de generosidade, pois compartilha experiências subjetivas e instiga-nos a percorrer caminhos desconhecidos.

Na feira do livro não encontramos os indiferentes, a não ser que, de tão entediados, a frequentem por falta de algo melhor a fazer. Esses nem sabem que a biblioteca da escola de seus filhos seja um mero depósito de livros, onde não existe paixão, onde não existe ponte, onde não existe um intermediário competente entre seus filhos e os livros.

Caminhar entre os estandes e saber que daqui a pouco vai chover, ou vai ventar forte, ou vai fazer um calorão, fazem parte da aventura de participar de feira do livro aqui no sul, onde tudo é charmoso, até o clima. Duvido que alguém não tenha corrido como louco, sacolas em punho, em busca de abrigo. Um charme!


Publicado em O Nacional em 12/11/2009

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Calorão

O Domingos, meu marido, sempre fala que nunca estamos satisfeitos com o tempo, o que nos caracteriza como seres humanos. Concordo com ele, pois no inverno temos saudade do verão e vice versa. Agora, como podemos ficar satisfeitos, se vivemos quase que somente de extremos? Nosso inverno foi chuvoso e extremamente frio e o verão nem começou e estamos ardendo em um inferno quente e abafado. Deveríamos contar com montanhas nevadas no inverno, o que proporcionaria uma paisagem condizente com o frio, e, no verão, uma praiazinha não seria nada mau. Mas, morar sem esses requisitos e com temperaturas tão extremas é brutal. O jeito é parar de reclamar e viver da melhor forma, abarrotando nossos guarda-roupas com mil edredons, guardá-los na parte de cima do guarda-roupa mil vezes, para trazê-los de volta logo que o tempo resolva dar uma virada. Somos aliás, um povo do sul, acostumado a experimentar as quatro estações do ano no mesmo dia. Li outro dia, que aquelas meninas lindas que anunciam o tempo na TV, são alvo de ressentimentos de parte dos espectadores, já que falam geralmente o que não queremos ouvir. A sensação que temos é que elas têm influência junto a São Pedro.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Morreu Lévi-Strauss

Quase completando 101 anos, morreu o antropólogo Lévi-Strauss. Sua contribuição para o pensamento contemporâneo é inestimável. Em suas andanças pelo interior do Brasil, compreendeu que cada organização social tem uma racionalidade, mesmo a mais primitiva e que "funcionamos" socialmente da mesma forma. Ajudou o ocidente a pensar o índio, por causa dos seus estudos e dos dados que levantou. A filosofia da linguagem deve-lhe muito também. Há poucos anos atrás disse uma frase emblemática: "Meu único desejo é um pouco mais de respeito para o mundo, que começou sem o ser humano e vai terminar sem ele - isso é algo que sempre deveríamos ter presente".

domingo, 4 de outubro de 2009

O DESEJO - entre o fogo e a luz

Este é o título do espetáculo que acabamos de assistir no Teatro do Sesc. Falei com várias pessoas que, unânimes, consideram o espetátulo tão bom quanto o Circle Du Soleil em Alegría. O musical é maravilhoso, o malabarismo circense é surpreendente e as danças perfeitas. Em Passo Fundo temos uma companhia que sabe tudo de palco e consegue proporcionar ao público todos os ingredientes que os grandes espetáculos do mundo oferecem. Temos que parabenizar a Cia. da Cidade e agradecer pelo que vem realizando pela beleza, pela música, pelo circo, pela dança e pela cultura em nossa cidade. Estou gratificada...

sábado, 26 de setembro de 2009

Lançamento na Academia de Letras

Conheci um rapaz, lá pelos idos da década de 60, líder estudantil num tempo em que o movimento dos estudantes era acontecimento importante. Paulo foi eleito presidente da União Passofundense de Estudantes (UPE), mais de uma vez. Todos reconhecíamos nele uma inteligência fora do comum, liderança nata e fazíamos festa pelas ruas em comemoração ao resultado das eleições. Eis que, adulto, Paulo mudou-se para Porto Alegre, fez carreira por lá, abandonou o jornalismo e dedicou-se ao Direito. Após muitos anos, vejo-o de vez em quando. Convidada que fui para o lançamento de um livro sobre viagens da sua autoria, fui-me à Academia com o mesmo entusiasmo de antigamente. Sabia de antemão que tudo seria muito bom e de qualidade. FORA DE ROTA da editora WS editor é um relato de viagens. Transcrevo a contracapa: "Mais do que narrativas de viagens, Fora de Rota de Paulo R. Pires, contém um valioso acervo de informações, resultante de criterioso trabalho de pesquisa do Autor, proporcionando uma leitura agradável e fluída. Ao mesmo tempo, fornece dados, opiniões e críticas sobre os países visitados, tudo isso temperado com boa dose de polêmica e de surpresas. Não escapam às observações de Paulo R. Pires, viajante experimentado, as inúmeras situações curiosas e peculiares protagonizadas pela gente comum em sua rotina diária, em lugares exóticos de países instigantes como Índia, Rússia, Vietnã, México, Turquia, Marrocos, Nepal, Laos, Camboja, Emirados Árabes e China."
Em sua explanação, Paulo contou suas impressões sobre o povo, a economia, a política, as artes, a arquitetura, os costumes dos países que visitou. Fiquei impressionada com sua fala, mais impressionada ainda estou com a leitura, com a visão das fotos que tirou e com sua capacidade de analisar o que chamamos de terceiro mundo, com sua acuidade jornalística em ver o que as pessoas comuns não veriam. Estou envolvida por palavras, danças, cheiros, sabores, lugares que nunca frequentei, mas que me são dados graças ao cuidado criterioso que o Paulo teve em elaborar sua obra.

quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Sobre respeito e autoridade


O incidente polêmico que envolve um adolescente pichador e uma professora merece algumas considerações com o intuito de ajudar a arrefecer os ânimos.

A professora é uma autoridade e uma referência dentro e fora da escola. Cabe a ela desempenhar o papel de adulto educador, capaz de tomar atitudes que ajudem os educandos a se conduzirem de forma adequada e civilizada. Atitudes que não condizem com estas prerrogativas deixam crianças e adolescentes à deriva, sem capacidade de assimilar os valores necessários a uma boa convivência social.

Um adolescente tem capacidade de entender quando é chamado a assumir seus atos, o que inclui a reparação dos danos que ele causa, não só ao patrimônio, mas a tudo e a todos. Danificar coisas, maltratar pessoas e animais, são atitudes de desrespeito que devem merecer especial atenção da parte dos adultos que cuidam e educam crianças e adolescentes. Uma atitude atenta pressupõe disposição para ajudar e para cobrar, o que não significa punir.

A cobrança por parte da professora para que o menino repintasse a parede foi correta em parte, pois deveria ter sido firme, respeitosa e só. O que se espera de um adulto numa hora destas é maturidade. A autoridade só se estabelece se ela é outorgada a alguém, reconhecida. Uma autoridade imposta por ameaças e xingamentos não se concretiza, mas fica esvaziada por conta do destempero, compreensível até certo ponto.

Uma professora executa a mais nobre das tarefas e a mais difícil também. Cuidar dos jovens requer um equilíbrio fora do comum e, para tanto, a professora deve ser cuidada adequadamente. Uma professora não deveria ter que pintar paredes, já que o lugar onde executa suas tarefas é de responsabilidade do Estado e ele deveria zelar pelo bem estar de seus trabalhadores; não deveria ser mal paga, para que sua carga horária não tivesse que ser tão grande; deveria ter educandos devidamente preparados para o exercício do respeito, da cidadania, para que não tivesse que exercer as prerrogativas dos pais, muitas vezes omissos e ausentes; e, deveria ser alguém cujo valor fosse reconhecido pelos gestores, a ponto de proporcionar-lhe tranqüilidade, material adequado, oportunidades de aperfeiçoamento e um lugar digno, limpo, bonito e agradável para trabalhar.

Quanto ao pai do menino pichador, entendemos sua indignação, pois ninguém suporta ver o filho ser xingado, porém, a parede foi repintada por quem deliberadamente a estragou e pai não tem que ajudar um filho nestas circunstâncias. Pai tem que dar exemplo, tem que ser firme e exigir que seu filho seja alguém que saiba o que é respeito e isso é uma grande coisa, mesmo que quase em desuso.

Aprendamos pois, por que é tropeçando que vamos percorrendo o caminho da educação, que é permanente e é feito por muitos atores. Nele não pode haver omissão, pois, na falta de um ator, outros ficam sobrecarregados e outros ainda, mal cuidados.

Atire a primeira pedra quem nunca se destemperou, quem nunca ficou desesperado, quem nunca ficou desesperançado frente a situação das escolas. O que queremos é dar nossa solidariedade à professora Maria Denise Bandeira e a tantos outros que realmente se importam com nossos meninos e meninas. As paredes conseguem ficar novinhas de novo, mas as pessoas envolvidas podem ter que carregar cicatrizes para sempre.

terça-feira, 22 de setembro de 2009

MANIFESTO CONTRA O TRADICIONALISMO - esclarecimento

O Manifesto que reprodizi foi escrito por um grupo de jornalistas e historiadores e está contido em muitos sites pela internet afora. Embora não o tenha escrito (quem me dera escrever tão bem e com tanta propriedade), comungo de todas as idéias que ele contém. Peço desculpas por haver esquecido de divulgar a origem do texto, por entendê-lo público e notório.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

MANIFESTO CONTRA O TRADICIONALISMO

I - Em defesa de uma cultura e de uma estética correspondentes à memória e à história do Rio Grande do Sul.

O Rio Grande do Sul é um estado da federação brasileira resultante de um longo processo histórico de conquista e ocupação, no âmbito da geopolítica colonial, na disputa territorial entre Portugal e Espanha. O território foi consolidado em suas dimensões definitivas no período imperial e teve pequenas áreas ajustadas na República Velha.

Em todo o ciclo histórico, observou-se o esforço de vidas humanas e material para a construção de um espaço luso-brasileiro nos séculos iniciais, e brasileiro, com a Independência, a partir de 1822. A população do Rio Grande concorreu para a invenção do Brasil soberano. Nesse ato, passou a ter uma identidade e a pertencer a um Estado-nação. Historicamente, a escolha rio-grandense foi pelo seu pertencimento brasileiro, rompendo com Portugal e tendo a América espanhola como sua alteridade.

Concorreram para a conquista, ocupação e formação da sociedade sulina indivíduos de diversos grupos sociais e étnicos, genericamente identificados como: portugueses, índios, negros, mamelucos, cafuzos, mestiços da terra; espanhóis, uruguaios, argentinos, paraguaios, que escolheram permanecer na terra independentemente dos tratados divisórios; imigrantes de projetos de colonização ou que se aventuraram individualmente, em especial, advindos de territórios atualmente inseridos na territorialidade da Alemanha, Itália, Polônia, Rússia, Ucrânia, Espanha, França, etc.

Ao longo do tempo, o rio-grandense se formou através da inserção em uma identidade política, na composição da brasilidade e da naturalidade regionalizada e fronteiriça. E no cotidiano, através da vivência de todas as culturas, hábitos e costumes de origem, reelaborados na dinâmica da convivência.

Nesse processo de formação, em diversos de seus setores, ocorreu um involucramento com a sociedade e a cultura platina e latino-americana.

Historicamente, o Rio Grande é multicultural e multi-étnico.

Cultural e simbolicamente é uma região de representação aberta, de recriação constante, como critério indispensável às manifestações de pertencimento, motivadas pelas transformações históricas, sociológicas e culturais, típicas de uma sociedade em movimento, de transformações estruturais e antropológicas, onde ainda se opera, por exemplo, a mestiçagem dos grupos étnicos de origem. Um estado onde as fronteiras internas são evidentes.

Portanto, só é legítima a cultura que representar esta diversidade.

Conseqüentemente, é ilegítimo todo o movimento ou iniciativa doutrinária de orientação pública ou particular que não represente a complexidade social e cultural do estado.

É alienante e escapista todo o movimento que impede e atua através de instrumentos de coerção cultural, midiático ou econômico, com o objetivo de dificultar os desenvolvimentos culturais e estéticos que tomam os indivíduos e as realidades contemporâneas como matérias de suas criações e vivências estéticas.

É repressor todo o movimento que milita através do governo, da educação, da economia e da mídia, para fechar os espaços das manifestações artísticas, das representações simbólicas e das inquietações filosóficas sobre os múltiplos aspectos do Rio Grande do Sul.

É doutrinador e usurpador do direito individual todo o movimento organizado que impõe modelos de comportamento fora de seu espaço privado, se auto-elegendo como arquétipo de uma moralidade para toda a sociedade.

Nessa direção, consideramos como legítimas as manifestações que tomam os rio-grandenses em suas complexidades históricas e culturais, dimensionados em seus tempos sociais, e que transformam, em especial, a sociedade contemporânea como expressões de suas criações estéticas, formulações teóricas e inquietações existenciais.

Somos, em razão disso, contra todas as forças que dogmatizam, embretam, engessam, imobilizam a cultura e o saber em "expressões" canonizadas em um espaço simbólico de revigoramento e opressão a partir de um "mito fundante", inventando um imaginário para atender interesses contemporâneos e questionáveis, geralmente identificados pela história como farsa e inexistência concreta. Consideramos que todo o processo de invenção e sustentação de uma visão "mitologizada" objetiva, unicamente, atender interesses atuais; é uma forma de militância que recorre à fábula, a ressignificação de rituais, hábitos e costumes, como forma de "legitimação" de causas particulares como se fossem "tradições" coletivas.

II - Em defesa de uma racionalidade sobre a história do Rio Grande do Sul, de equivalência para todos os construtores de nossa sociedade, de equiparação e direito para todas as manifestações culturais, de inclusão multicultural e respeito às heranças étnicas, sem que todas essas expressões sejam diluídas em um gauchismo pilchado de civismo ufanista, ideológico e manipulador dos mais sinceros sentimentos do povo.

Fundamentados nos princípios acima e nos demais existentes no transcurso deste manifesto, identificamos o MOVIMENTO TRADICIONALISTA GAÚCHO (MTG) como o principal instrumento de negação e destruição desses traços culturais e direitos fundamentais do povo rio-grandense.

Nossa posição se fundamenta nos seguintes argumentos:

1.. Somos contra o Movimento Tradicionalista Gaúcho, especialmente porque, em sua cruzada unificadora, construiu uma idéia vitoriosa de "rio-grandense autêntico", pilchado e tradicionalista, criando uma espécie de discriminação, como se a maioria da população tivesse uma cidadania de segunda ordem, como "estrangeira" no "estado templário" produzido fantasiosamente pela ideologia tradicionalista.

2.. Somos contra o Movimento Tradicionalista Gaúcho, por identificá-lo como um movimento ideológico-cultural, com uma visão conservadora e ilusória sobre o Rio Grande, cujo sucesso se deve, em especial, à manipulação e ressignificação de patrimônios genuínos do povo, pertencentes aos seus hábitos e costumes.

3.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele não é a Tradição, mas se arrogou de seu representante e a transformou em elemento de sua construção simbólica, distorcendo-a, manipulando-a, inserindo-a em uma rede gauchesca aculturadora, sem respeito às tradições genuinamente representativas das diversidades dos grupos sociais.

4.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele não é Folclore, mas o caducou dentro de invernadas artísticas e retirou dele seus aspectos dinâmicos e pedagógicos; o seu apresilhamento ao espírito e ao sentido do pilchamento do estado está destruindo o Folclore do Rio Grande do Sul.

5.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele é um movimento organizado na sociedade civil, de natureza privada, mas que desenvolveu uma hábil estratégia de ocupação dos órgãos do Estado, da Educação e de controle da programação da mídia, conseguindo produzir a ilusão de que o tradicionalismo é oficialmente a genuína cultura e a identidade do Rio Grande do Sul. A "representação" tomou o lugar da realidade.

6.. Somos contra o Tradicionalismo, porque, insensível à história e à constituição multicultural do Rio Grande do Sul, através de procedimentos normativos, embretou o rio-grandense em uma representação simbólica pilchada.

7.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele criou um calendário de eventos e, através de seus prepostos, aprovou leis que "reconhecem" o próprio tradicionalista como modelo gentílico, apesar de ser, em verdade, um ente contemporâneo, sem enraizamento histórico e cultural.

8.. Somos contra o Tradicionalismo porque identificamos nele a criação de instrumentos normativos usurpadores, com a ambição de exercer um controle sobre a população, multiplicando a cultura da "patronagem", com a reprodução de milhares de caudilhetes que tiranizam os grupos sociais em seu cotidiano. Tiranetes que, com sua truculência, ditam regras "estéticas" e limitam os espaços da arte e da cultura, lançando o preconceito estigmatizador, pejorativo e excludente, sobre formas de comportamento e manifestações artísticas inovadoras ou sobre concepções do regional, diferentes da matriz "cetegista", mesmo quando essas manifestações surgem no interior do próprio Tradicionalismo.

9.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele instrumentaliza política e culturalmente uma visão unificadora, como se a origem identitária do Rio Grande estivesse no movimento da "minoria farroupilha", falseando sobre a sua natureza "republicana", elencando um panteão de "heróis" latifundiários e senhores de escravos, como se fossem entes tutelares a serem venerados pelas gerações atuais e vindouras.

10.. Somos contra o Tradicionalismo, por ele se fazer passar por uma Tradição, desmentida pela própria história de sua origem, ao ser inventado através de uma bucólica reunião de estudantes secundaristas, em 1947, no colégio Júlio de Castilhos, em Porto Alegre.

11.. Somos contra o Tradicionalismo, porque ele se transformou em força institucional e "popular", em cultura oficial, através dos prepostos da Ditadura Militar no Rio Grande do Sul.

a) Na verdade, em 1964, o Tradicionalismo foi incluído no projeto cultural da Ditadura Militar, pois o "Folclore", como fenômeno que não pensa o presente, serviu de alternativa estatal à contundência do movimento nacional-popular, que colocou o povo e seus problemas reais no centro das preocupações culturais e políticas.

b) O Tradicionalismo usurpou, assim mesmo, o lugar do Folclore, e se beneficiou do decreto do general Humberto Castelo Branco, de 1965, que criou o Dia Nacional do Folclore, e suas políticas sucedâneas. A difusão de espaços tradicionalistas no Estado e as multiplicações dos galpões crioulos nos quartéis do Exército e da Brigada Militar são fenômenos dessa aliança.

c) A lei que instituiu a "Semana Farroupilha" é de dezembro de 1964, determinando que os festejos e comemorações fossem realizados através da fusão estatal e civil, pela organização de secretarias governamentais (Cultura, Desportos, Turismo, Educação, etc.) e de particulares (CTGs, mídia, comércio, etc.).

d) Durante a Ditadura Militar, o Tradicionalismo foi praticamente a única "representação" com origem na sociedade civil que fez desfiles juntamente com as forças da repressão.

e) Enquanto as demais esferas da cultura eram perseguidas, seus representantes censurados, presos, torturados e mortos, o Tradicionalismo engrossou os piquetes da ditadura - seus serviçais pilchados animaram as solenidades oficiais, chulearam pelos gabinetes e se responsabilizaram pelas churrasqueadas do poder. Esse processo de oficialização dos tradicionalistas resultou na "federalização" autoritária, com um centro dominador (ao estilo do positivismo), com a fundação do Movimento Tradicionalista Gaúcho, em 1967. Autoritário, ao estilo do espírito de caserna dos donos do poder, nasceu como órgão de coordenação e representação. Enquanto o general Médici, de Bagé, era o patrão da Ditadura e responsável, juntamente com seu grupo, pelos trágicos anos de chumbo que enlutaram o Brasil na tortura, na execução, na submissão à censura, na expulsão de milhares de brasileiros para o exílio, os tradicionalistas bailavam pelos salões do poder. Paradoxalmente, enquanto muitos freqüentadores de CTGs eram perseguidos ou impedidos de transitarem suas idéias políticas no âmbito de suas entidades, o Tradicionalismo oficialista atrelou o movimento ao poder, pervertendo o sentimento de milhares de pessoas que nele ingressaram motivados por autênticos sentimentos lúdicos de pertencimento e identidade fraterna.

f) Através da relação de intimidade com a ditadura, o MTG conseguiu "criar" órgãos estatais de invenção, difusão e educação tradicionalista, ao mesmo tempo em que entregou, ou reservou diversos cargos "públicos", para seus ideólogos, sob os títulos de "folclorista", "assessor cultural", etc.

g) O auge do processo de colaboração entre a Ditadura e o MTG foi a instituição do IGTF - Instituto Gaúcho de Tradição e Folclore, em 1974, consagrando uma ação que vinha em operação desde 1954. A missão era aparentemente nobre: pesquisar e difundir o folclore e a tradição. Mas do papel para a realidade existe grande diferença. Havia um interesse perverso e não revelado. A constituição do quadro de pessoal, ao contrário da inclusão de antropólogos, historiadores da cultura, pessoas habilitadas para a tarefa (que deveriam ser selecionadas por concurso público), o critério preponderante para assumir os cargos era, antes de tudo, a condição de tradicionalista. Assim, um órgão de pesquisa, mantido pelo dinheiro público, transformou-se em mais uma mangueira do MTG. Com o passar dos anos, os governos que tentaram arejar o IGTF, indicando dirigentes menos dogmáticos, invariavelmente, entraram em tensão com o MTG.

h) Essa rede de usurpação do público pelo Tradicionalismo, por fim, atingiu a força de uma imanência incontrolável. Em 1985, já na redemocratização, o MTG conseguiu que a Assembléia Legislativa instituísse o Dia do Gaúcho, adotando como tipo ideal o "modelo" tradicionalista.

i) Em 1988, com uma manipulação jamais vista na vida republicana, o MTG se mobilizou pela aprovação da lei estadual que estabeleceu a "obrigatoriedade do Ensino de Folclore"; na regulamentação, a lei determinou que o IGTF exercesse a função de "suporte técnico", sem capacitá-lo pedagogicamente. De fato, passou a ocorrer uma relação direta entre as escolas e os CTGs. Dessa maneira, o Tradicionalismo entrou no sistema educacional, transgredindo a natureza da escola republicana como lugar de estudo e saber, e não de culto e reprodução de manuais. Hoje, os alunos são adestrados pela pedagogia de aculturação e cultuação tradicionalista.

j) Por fim, em 1989, a roupa tradicionalista recebeu o nome de "pilcha gaúcha", e foi convertida em traje oficial do RS, conforme determinação do MTG.

12.. O grande poncho do MTG, por derradeiro, foi tecido pela oficialização dos símbolos rio-grandenses, emanados diretamente do simulacro da "república" dos farroupilhas.
III - Em defesa de uma cultura que respeite os tempos de registro histórico-cultural e de representação contemporânea e sua densidade histórica.

13.. Somos contra o MTG, porque consideramos indispensável para a cultura regional distinguir os fenômenos da história dos da memória, identificar os eventos em seus tempos históricos e desenvolver um conhecimento em que os tempos históricos não sejam diluídos nas celebrações contemporâneas e seus interesses ideológicos, culturais e econômicos. A "institucionalização" de uma cultura cívica e de lazer tradicionalista como "legitimidade", reforçada e inserida na indústria cultural pilchada, impõe uma visão da sociedade e do passado, segundo a ótica dos interesses dos indivíduos que operam socialmente na atualidade. Através dessa falsa "historicidade", eles se legitimam como "autênticos" e podem especular com este inventivo "selo de qualidade".

14.. Somos contra o MTG, porque a sua atividade de militância "aculturadora", ressignificando símbolos, ícones, eventos históricos, em um espaço praticado e imaginado como o ethos de uma estância atemporal, empobrece culturalmente o Rio Grande do Sul e, de fato, relega etnias e grupos sociais, historicamente importantes, à massa dos "sem-simbologia".

15.. Somos contra o MTG, porque o seu controle e patrulhamento vigora sobre a sociedade como um espectro opressivo, em muitos casos como uma maldição, como uma ameaça punitiva, desclassificativa daqueles que não ideologizam as pilchas ou não se enquadram nos modelos "humanos", geralmente caricaturais, decretados pelo MTG.

16.. Somos contra o MTG, porque aqueles que se libertam de sua doutrina, depois do longo processo de adestramento, geralmente iniciado na infância, enfrentam traumas de identidade, especialmente ao descobrirem suas "versões manipulatórias" da história, como a de que o povo do Rio Grande do Sul se levantou contra o Império, ou que os farroupilhas eram republicanos.

17.. Somos contra o MTG, porque ele pratica a demência cronológica e estatística, impondo a deturpação de que o povo se levantou contra o Império e os imigrantes e seus descendentes também cultuaram a Revolução Farroupilha, quando, quase em sua totalidade, sequer estavam no RS entre 1835 e 1845. Se um dia aportaram no Brasil, isso se deve ao projeto de colonização do Império. Os projetos de colonização fundamentais, que contribuíram para a formação do Rio Grande do Sul contemporâneo, não pertenceram aos farroupilhas.

18.. Somos contra o MTG, porque ele ajudou a instituir e alimenta em seu calendário de celebrações, nas escolas, na mídia, um panteão de "heróis", na sua maioria senhores de escravos.

19.. Somos contra o MTG, porque ele é uma força militante ideológica e cultural que trabalha contra a criação de uma mentalidade ilustrada; a transposição para o presente de personagens do antigo regime, como "lumes tutelares" a serem adorados, impediu que se fizesse, nesse particular, um movimento cultural com a densidade dos princípios consagrados pela Revolução Burguesa.

20.. Somos contra o MTG, por ele ter transformado a população em adoradora de senhores de escravos (no geral, sem saberem).

21.. Somos contra o MTG, especialmente, porque defendemos o RS da inclusão, da convivência multicultural, de todas as indumentárias, de todos os ritmos, de todas as danças, de todas as emoções, de todos os trabalhos e ofícios, de poéticas de múltiplos espaços, e não da territorialidade simbólica exclusiva do pampa.

22.. Somos contra o MTG, porque desejamos construir espaços poéticos que representem também a complexidade de nosso tempo.

23.. Somos contra o MTG, porque, em defesa dos postulados da liberdade de criação e de comportamento, do saber sobre o culto inócuo e ideologicamente manipulador, o identificamos como o instrumento preponderante de negação dos direitos elementares da liberdade, da igualdade e da fraternidade.

24.. Somos contra o MTG, por se tratar de um movimento de interesse hegemonizador sobre a sociedade sul-rio-grandense, de caráter privado, que transgride a sua esfera particular, para operar um autoritarismo de conversão dogmática da população a um estilo gauchesco, inventado e normatizado por seus membros, como expressão estilística de um pretenso gentílico de conteúdo e forma cívico-ufanista.

25.. Somos contra o MTG, porque, ao se transformar arbitrária e oficialmente em uma imagem gentílica, se converteu em um movimento de intolerância cultural no Rio Grande do Sul e em outras regiões do Brasil e do mundo, através de instalações de CTGs que não respeitam as culturas locais, que invadem como intrusos localidades de tradições milenares, usurpando seus espaços, destruindo sua poética popular e deturpando sua arquitetura. Nessa operação, o Tradicionalismo não é uma "representação" aceitável da cultura sulina, mas o instrumento de uma "aculturação", da não inserção dos grupos migrantes nas culturas locais, transformando-se, de fato, em agente de destruição.

26.. Somos contra o MTG, porque, ao se converter em uma representação do Rio Grande do Sul e exercitar sua arrogância aculturadora em outros espaços sócio-culturais, fazendo uma escolha pela não inserção e respeito às populações do restante do Brasil e do mundo, está desencadeando movimentos de reação discriminatória contra os "gaúchos". Devido às posturas dos tradicionalistas, tornam-se cada vez mais freqüentes campanhas populares de "Fora gaúchos" em outros estados da federação, confundindo os "tradicionalistas" com os "rio-grandenses", jogando sobre o povo do RS um estigma motivado unicamente pelo "cetegismo". Essa militância tradicionalista contribui, de fato, para a difusão da intolerância na população sulina.

27.. Somos contra o MTG, por considerá-lo agente de um dano irreparável à maioria dos sul-rio-grandenses frente ao Brasil, pois defendemos princípios de identidades regionais harmonizados com as genuínas culturas locais das demais regiões brasileiras.

28.. Somos contra o MTG, por ele se apresentar militantemente em outras unidades da federação, em seu extremo, como uma "etnia gaúcha", deturpando a formação multi-étnica sul-rio-grandense, e ofendendo, além de tudo, os conceitos mais elementares da Antropologia.

29.. Somos contra o MTG devido a sua soberba de pressionar outros estados brasileiros para adotar a "pilcha gauchesca" como traje oficial, produzindo ainda maior rejeição aos sul-rio-grandenses.

30.. Somos contra o MTG no Rio Grande do Sul e nos demais estados brasileiros pela sua articulação incessante para se transformar na cultura oficial, ou ser reconhecido como "uma representação externa", e desejar se constituir em guardião dos símbolos, dos ícones e do imaginário do povo.

31.. Somos contra o MTG, porque, como entidade privada, ele tange, em sua arreada intolerante, grande parte das verbas públicas dos setores da cultura, da educação, do turismo, da publicidade e da Lei de Incentivo à Cultura das empresas estatais, fundações e autarquias, para o seu imenso calendário de eventos, onde, nem sempre, se distingue a cultura do turismo e do lazer.

a) Em defesa da cultura rio-grandense postulamos pela instalação de uma CPI na Assembléia Legislativa, para investigar a transferência de verbas e infra-estruturas públicas para as atividades tradicionalistas, o que caracteriza flagrantemente uma usurpação do patrimônio público.

b) Reivindicamos audiências públicas ao Conselho de Cultura, para discutir a canalização da LIC para um excessivo predomínio de projetos tradicionalistas, muitos de caráter turístico e de lazer, iludindo a natureza da Lei.

c) Alertamos e igualmente reivindicamos audiências públicas ao Conselho de Educação, para discutir a deturpação dos currículos e dos princípios de Educação Pública, em conseqüência da infestação, da usurpação e da distorção pedagógica representada pela invasão tradicionalista nas escolas, substituindo os preceitos do "saber", do "estudar", pelo "culto" e pelos "manuais" tradicionalistas. O indicativo dessa distorção e atropelo obscurantista é a transformação do próprio espaço escolar, com a criação de "piquetes" e "invernadas artísticas". Essa situação revela a falência pedagógica da escola, o abandono de sua natureza laica e republicana. Os alunos são induzidos a comportamentos e práticas dogmáticas, adestradoras, apresilhados a uma identidade questionável, originada em um mito fundante. Essa escola doutrinariamente cívica, "gentílica" e de "orgulho gaúcho" exercita a fé, a pertença alienada. Ela significa a falência da Educação. Por essa razão, reconhecemos como legítima a revolta daqueles professores que rejeitam a sua conversão em instrumentos de realização do calendário tradicionalista, como se fossem meros executores de seus manuais dentro dos educandários. Reconhecemos como legítima a resistência dos professores às pressões para serem transformados em pregadores pelas direções, pelo poder e por alguns ciclos de país e mestres, pois esse enquadramento significa a negação de suas funções constitucionais de educadores.

32.. Somos contra o MTG, porque, entre todas as suas deturpações, a mais grave é representada pela sua própria oficialização, cujo corolário é a ambição de instituir como "legalidade" a sua versão da história, através de uma legislação introduzida progressivamente na esfera pública. Em alguns processos judiciais contra pessoas transformadas em réus, por terem feito crítica ao Tradicionalismo ou aos seus atos, os advogados do MTG argumentam com "base" em leis que os parlamentares tradicionalistas criaram, em decretos de seus executivos, em "epistolas" de seus ideólogos.

33.. Somos contra o MTG, porque, devido à sua ação de controle cultural, uso das verbas públicas, interferência nos currículos escolares, vigilância sobre os meios de comunicação, imposição manipulatória de uma idéia de "história" que converteu em "heróis" senhores de escravos, sua hegemonia e operação militante no Estado, na sociedade civil e no senso comum, contribui para a mediocrização do Rio Grande do Sul em seus aspectos culturais, de inserção moderna e respeitosa no Brasil e na América, produzindo uma incapacidade de leitura crítica da sociedade rio-grandense e do mundo. Nas últimas décadas, os acontecimentos culturais populares importantes se constituíram na relação e na contradição com o Tradicionalismo. Na maioria dos casos tiveram que superá-lo, ou negá-lo, para sobreviverem e afirmarem os seus espaços estéticos.

34.. Somos contra o MTG em sua usurpação do público, mas, por outro lado, ainda como manifestação de nossos princípios republicanos, defendemos o MTG quanto ao seu direito privado, ao seu exclusivo espaço cultural, à noção de que ele é apenas um segmento interpretativo da história e da cultura do Rio Grande do Sul, sem que as suas convicções singulares tenham a ambição e a ação militante ilegítima de "aculturação" das demais esferas sociais e culturais do estado, sem que se coloque no topo de uma hierarquia dominante e exclusivamente gauchesca da identidade.

35.. Somos contra o MTG, exclusivamente, no que tange à usurpação das esferas públicas e à coerção de nossos direitos civis, culturais e estéticos.

36.. Somos contra o MTG, porque identificamos nele a alimentação de uma sinergia cultural que atolou o Rio Grande do Sul no passadismo conservador, criando uma força de pertencimento que bloqueia o desenvolvimento de uma energia socialmente humana moderna, humanista, republicana, respeitosa com os sentimentos historicamente multiculturais da população rio-grandense.

37.. Somos contra o MTG, porque nos sentimos reprimidos, cerceados e vitimizados, cultural e profissionalmente, por ele, identificando-o como uma força militantemente dogmática contra os nossos direitos e cidadania.

38.. Somos contra o MTG, porque defendemos o Folclore representativo da nossa multiplicidade étnica, consideramos as frações da Tradição que expressam as relações humanizadas e o espírito solidário do povo sul-rio-grandense, a Cultura Popular, os espaços efetivos para uma cultura que expresse nossa historicidade, desde o passado até a atualidade, e, principalmente, porque postulamos uma estética sem embretamentos, capaz de apreender a complexidade regional com suas particularidades e conexões universais.

Rio Grande do Sul, março de 2007.


sábado, 29 de agosto de 2009

Dez centavos


A afirmação de Rousseau de que somos bons por natureza, ganha corpo no maravilhoso curta entitulado 10 Centavos, pois é uma ode à ética natural de que somos dotados, à qual relativizamos conforme ficamos mais “civilizados”.

O filme trata da trajetória de um menino, que transita por Salvador, começando de manhã e entrando pela madrugada. O menino inicia o dia com uma dívida de 10 centavos, fato que lhe causa uma enorme preocupação. Desenrola-se a partir daí uma corrida contra o tempo, contra a fome, contra o calor, o cansaço e culmina com a cena dele indo deitar-se, ajeitando-se sobre um colchão cheio de gente, sem tomar banho, sem ser recebido por ninguém, no meio da escuridão silenciosa.

O filme permite que se deduza, com tristeza, que criança trabalha ainda hoje, como sempre trabalhou, mesmo que queiramos negar isso. Ele não está em uma carvoaria, nem em uma mina, nem em uma fábrica, nem na lavoura, lugares comuns de se encontrar crianças trabalhando, mas está na rua lavando carros, guardando-os enquanto isso, vendendo flores e tentando sobreviver aos perigos que uma cidade oferece a qualquer pessoa. Deduz-se também, que ele é um menino bom por natureza, pois é evidente seu empenho em ser correto com as pessoas, em pagar os dez centavos que fica devendo aqui e ali.

O que comove é o comportamento ético escancarado de um menino que não sorri, não brinca, não come direito e, pelo jeito, não estuda. Nos é familiar o comportamento dos adultos, que o tratam com cortesia, mas com uma evidente indiferença, como se fosse natural haver uma criança solta pelas ruas, trabalhando e pegando um trem de madrugada. No seu jeito de chamar as pessoas de tio, transparece algo corriqueiro e familiar, como se ele estivesse acostumado àquela vida.

O filme convida-nos a refletir sobre o que é ser civilizado, e, sobretudo, sobre nossa atitude condescendente frente à condição vivida por milhões de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Mostra-nos alguém que não tem condições de ser criança, já que não vai à escola, não senta à mesa para comer com a família, não tem uma cama para si, não tem tempo para brincar, não há ninguém que o proteja, ninguém que converse com ele, a não ser os que eventualmente se disponham a isso na rua.

10 Centavos pode ser encontrado nos sítios www.portacurtas.com.br ou no www.youtube.com.br. Quem o assiste fica meio desconfortável, ao mesmo tempo tomado de compaixão por todos os meninos e meninas privados de seus direitos fundamentais. Imperdível!

sábado, 8 de agosto de 2009

Precisa-se de mais pais



Há iniciativas no sentido de incentivar pais a registrarem seus filhos, pois todos os filhos têm o direito a que o nome do pai figure na certidão de nascimento, assim como o nome da mãe.

Ter um pai e saber o nome dele contribui para a construção de identidade, melhora a autoestima e sugere aceitação. O contrário pressupõe abandono.

É importante que os professores fiquem atentos, a exemplo do que acontece no Mato Grosso, onde os professores procuram descobrir os pais de seus alunos e os encaminham para o registro civil, amparados na Lei 12.004, sancionada pelo Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Segundo essa lei, que ratifica o que já vinha vigorando nos tribunais, a recusa em fazer a investigação de paternidade por exame de DNA, é considerado confissão.

A lei vem em bom momento, em meio a discussões de como estabelecer limites ao comportamento das crianças e adolescentes. Raramente discutem-se limites para as ações dos adultos, que abandonam, ignoram, abusam e se recusam a registrar os filhos que geraram em momentos em que não pensaram nos limites.

Enquanto transformamos a palavra “limite”, em moda, os abrigos vão se enchendo, condenando criancinhas a passar anos em instituições que são um arremedo de lar e assistimos ao descalabro de prender milhares de adolescentes em instituições que pretendem recuperá-los das sequelas do que sofreram por causa do abandono, na maioria das vezes.

Antes de falarmos em limites, falemos em paternidade responsável, falemos em amor e cuidado, pois, recusar-nos a cuidar dos nossos filhos é algo que não pode ser recuperado, pois causa sofrimento aos filhos e priva-nos das maiores alegrias que a vida nos oferece. Ser pai é a experiência mais significativa na vida de um homem.

O Dia dos Pais é uma ótima oportunidade para que procuremos dentro de nós uma capacidade inata, um potencial amoroso que pode e deve ser colocado em prática, para que as crianças sintam que são amadas, para que sintam que os adultos que os rodeiam são pessoas responsáveis e garantidoras da sua segurança.

Pais responsáveis registram seus filhos, primeiro passo para a cidadania, depois cuidam adequadamente deles, proporcionando-lhes amor e segurança, imprescindíveis para seu equilíbrio físico e emocional.


Publicado hoje no jornal Diário da Manhã

sexta-feira, 31 de julho de 2009

11 consejos para enseñar a pensar a los hijos


Fuente: arvo.net
Autor: Luis Olivera

1. Lo primero es actuar de acuerdo con la verdad de las cosas.

Enseñar a los hijos a no engañarse, a ser sinceros, a actuar con coherencia. “Podemos conocer la química cerebral que explica el movimiento de un dedo, pero eso no explica por qué ese movimiento se usa para tocar el piano o apretar un gatillo” (Marcus Jacobson).Y “no podemos abaratar la verdad” (F. Suárez), devaluando su valor, como si fuera época de rebajas.

2. Un segundo es que “el entrenamiento es una exclusiva de la inteligencia humana” (Marina).

Hay que enriquecer el lenguaje, hay que fomentar el diálogo, el ejercicio mental de razonar, de defender una causa, de tener argumentos para las propias decisiones, y no hacer sólo lo que hacen los demás, como los borregos. Aprender a pensar es descubrir todo el inmenso poder que tiene la moda en el mundo y saber salir de la jaula mental en que puede encerrarnos. El pensador libre, es decir, el pensador, no debe sacrificar su libertad de pensar en el altar de la moda. Sacrificar la verdad en el altar de la moda es una de las perversiones más nocivas del pensador.. Sin embargo, con excesiva frecuencia se encarcela a la razón en la jaula de la moda. Entrenamiento y cultivo, dado que “la tierra que no es labrada, llevará abrojos y espinas, aunque sea fértil. Así sucede con el entendimiento del hombre” (Sta. Teresa de Jesús).

3. Ya que es imposible no equivocarse nunca, al menos, por utilidad y por deber, hemos de aprender de nuestras equivocaciones.

Si queremos aprender a pensar, deberemos descubrir el mundo tan humano del error. "Equivocarse es humano", descubrieron los antiguos. El error es el precio que tiene que pagar el animal racional.

4. Deliberar es la segunda etapa de la voluntad.

Seremos más inteligentes y más libres cuando conozcamos mejor la realidad, sepamos evaluarla mejor y seamos capaces de abrir más caminos. Sería un error pensar, observa Leonardo Polo, que el hombre inventó la flecha porque tenía necesidad de comer pájaros. También el gato tiene esa necesidad y, no ideó nada. El hombre inventó la flecha porque su inteligencia descubre la oportunidad que le ofrece la rama.

5. Mantener abierta nuestra capacidad de dirigir nuestra conducta por valores pensados.

Hay que pasar del régimen del impulso irracional al régimen de la inteligencia. Más que enseñar a pensar, la función de los padres ha de consistir en motivar a los hijos para que quieran pensar, por cuenta propia. Con actitudes positivas, las niñas se comen el mundo; con actitudes negativas, el pensar aparece como algo cansino; el actuar, como mediocre.

6. Enseñar a tomar decisiones. La inteligencia es la capacidad de resolver problemas vitales.

No es muy inteligente quien no sea capaz de decidir, aunque dentro de su refugio resuelva con soltura problemas de trigonometría. Si convenimos que educar es, esencialmente, crecer en libertad y en responsabilidad, aprender a decidir bien resulta uno de los aspectos claves de esa tarea: cuanta más capacidad de decisión, más libertad.

7. “Debemos recuperar de los niños, y fomentarla, la sana estrategia de preguntar continuamente.

Las tres preguntas fundamentales son: ¿Qué es? ¿Por qué es así? y ¿Ud., cómo lo sabe? Aristóteles definía la ciencia como “el conocimiento cierto por las causas”. Pues, habituarse a formular por qués. Los padres deben estimular, motivar, comentar y promover el clima adecuado para favorecer los hábitos intelectuales de sus hijas.

8. La inteligencia que planteamos tiene que saber aprender y, sobre todo, tiene que disfrutar aprendiendo.

Formular preguntas que ayuden a ser más reflexivos, a interrogarse sobre el pensamiento: ¿Por qué piensa el hombre? ¿Has pensado por qué recuerda cosas? ¿Pensamos mientras dormimos? ¿Qué es lo que más te hace pensar? ¿Puedes pensar en dos cosas distintas a la vez? Leonardo Polo define al hombre como un ser que, no sólo soluciona problemas, sino que además se los plantea. En efecto, el ser humano progresa planteándose nuevos problemas y buscando solucionarlos.

9. La inteligencia debe de ser eficazmente lingüística.

Ya gracias al lenguaje, no sólo nos comunicamos con los demás, sino con nosotros mismos. La inteligencia no se parece a una colección de fotografías, sino a un río. Río e inteligencia “discurren”. Nuestra lengua natural, la materna, es un río donde confluyen miles de afluentes. "La pluma y la palabra son las armas del pensador" (JA Jauregui): aprender a pensar es aprender a tocar dos instrumentos del pensamiento: la pluma y la palabra.

10. Fomentar la lectura y controlar el uso de la TV.

Ya que hablamos del vuelo de la inteligencia, se trata de “ser más inteligentes que la TV” (Jiménez). Los libros “tienen que ser obras que alimenten la inteligencia sin dejar seco el corazón”. O sea, que deben iluminar la mente con la verdad y no sumirla en las nieblas de la duda o en la oscuridad del error” (F. Suárez).

11. Urge encontrar tiempos para reflexionar, para pensar, que es menos trabajoso y más barato que otras necesidades que nos creamos.

Sobre el sentido último de la vida, de las cosas, del hombre, de Dios. Cuando Unamuno dijo que solía ir a pasear con pastores de ovejas para aprender a pensar, para deshacerse de prejuicios y dogmas de escuela, todos se rasgaron las vestiduras. Sin embargo, Unamuno era sincero. Un pastor de ovejas tiene tiempo para pensar, para dar rienda suelta a su imaginación y descubrir nuevos horizontes filosóficos que no ha visto nunca ningún otro filósofo.Fernando Corominas dice que hay que “sentar” en la mente y en el corazón de los hijos las cosas buenas, antes de que les lleguen las nocivas. Es llegar antes, es educar en futuro. Siempre que nos abandonamos, retornamos a la selva. La selva de la que hablo metafóricamente es siempre una claudicación de la inteligencia.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Dizem que é a charge do ano...


Nossos hábitos alimentares estão melhorando?




Nós os pais mais velhos, fomos criados com a parcimônia do pós guerra. Nossos pais ofereciam-nos uma alimentação controlada, em mesa posta e em horários rígidos.
Não nos era permitido cortar salame ou queijo de qualquer jeito, havia regras. Pão novo só comíamos após acabar o velho. Aprendemos a desejar um momento de descuido para comer nacos maiores do que nos agradava. Jamais permitiram que ficasse depósito de açúcar no fundo da xícara.
Não lembramos de que nossos pais fossem ao médico com a queixa de que não queríamos comer nada. A comida era servida e comíamos e pronto.
Ao nos tornarmos pais, decidimos fazer diferente. A austeridade deu lugar à abundância, a ponto de não permitirmos que nossos filhos sentissem sequer sede. Não nos contentamos em servir a mesa, mas fiscalizamos e controlamos tudo. O pediatra foi torturado por queixas, deu consultas só para dizer-nos que nossos filhos estavam ótimos. Mandamos fazer exames de laboratório por medo de que estivessem desnutridos. Vimos nossos filhos ficarem maiores do que nós, porém, hoje, carregam consigo um arsenal de lanchinhos, garrafas d’água, gomas de mascar, na tentativa de não sentirem fome nunca. Abrem a geladeira, olham e, se faltar um ítem do que estão acostumados, dizem que não há “nada” para comer.
Nossos netos têm vícios alimentares inimagináveis na nossa infância. É obrigatório o consumo de biscoitos, salgadinhos de pacote brilhante, refrigerantes. As exceções são criticadas. Sanduíche de manteiga e geléia definitivamente não é sanduíche.
Hoje os pediatras tratam de colesterol, obesidade, depressão, excitação exagerada. As queixas dos pais são de que as crianças só querem comer porcaria.
Em meio a tanta oferta de maçãs lindas, enormes e suculentas, tão raras na nossa infância, estamos nos esforçando no sentido de despertar nas crianças o gosto por elas. Não adianta contar que fingíamos estar doentes na tentativa de que comprassem uma maçã para nós. Elas eram importadas, e caras. Hoje elas são mais baratas do que os pacotinhos de frituras malcheirosas.
Há perguntas que nos fazemos: será que estamos melhorando nos nossos hábitos? Estamos comendo bem? Podemos confiar nos rótulos das embalagens das “comidas de plástico” como Eduardo Galeano chama as “porcarias”?
O que vemos são salas de cinema transformadas em lanchonetes onde sentimos cheiro de gordura e ouvimos barulho de papel de bala. Será que mastigar o tempo todo faz bem? Não creio que queiramos voltar a comer pedacinhos transparentes de salame, mas os exageros também são condenáveis. Ou não?