terça-feira, 30 de setembro de 2008

Mal estar


Sente-se perfeitamente no ambiente quando não somos bem recebidos. O mal estar que se estabelece é algo concreto, quase visível. Em família isso é mais do que sensível, já que as pessoas se conhecem de longa data. Estou falando da família ampliada, já que na nuclear não há como disfarçar, pois vive-se grudado e os conflitos são vividos, não só sentidos. Na família ampliada é difícil disfarçar as animosidades, as fofocas, as coisas do passado que continuam a assombrar seus membros, mesmo muitos anos depois que fatos desagradáveis aconteceram. Amadurecemos desde que fomos concebidos e o processo não pára. Nossa maturidade nunca está pronta e costumamos nos culpar por atitudes que tomamos, sem levar em conta que, no momento em que as tomamos, era o melhor que podíamos, o melhor que tínhamos a oferecer. Usar atitudes do passado, carregados de emoção e de imaturidade para embasar o presente, é muito perigoso. Acusar aos outros ou a nós mesmos pode causar estragos irreparáveis. Por isso, nós os pais, devemos adotar políticas familiares que sejam avessas em contar fatos desagradáveis acerca da família, por que ao fazê-lo provocamos rejeição e pré-conceitos que prejudicam o que reputo da maior importância: o respeito que devemos ter por avós, tios e primos, por representarem a nossa história. O crime de desacreditarmos pessoas, de desqualificarmos pessoas é um desserviço ao crescimento saudável dos nossos filhos. Os filhos devem ser pessoas com boa auto-estima, com um potencial afetivo que seja visível na forma de atitudes gentis e confiantes. Todos os pais querem que os filhos sejam socialmente aceitos e isso tem um preço. O preço é olharmos com generosidade para o passado, é nos perdoarmos do que fizemos e que hoje não faríamos mais, é perdoar o que fizeram conosco, pois isso não podemos mudar. Considero crime contar mentiras e denegrir imagens que poderiam ser importantes para a estruturação dos nossos filhos e que, se não são, foram destruídas de alguma forma. Temos só uma família de origem e é difícil para todos conviver com ela pela vida afora sem que se tenha que abrir feridas que já fecharam, sem que se abram novas feridas. Penso que a gente diminui os estragos, preservando os filhos de ver feridas abertas, permitindo que, se inevitável, vejam somente cicatrizes.

domingo, 28 de setembro de 2008

Claudia Furlanetto


Votarei em Claudia Furlanetto para vereadora. Não sei quantos daqui de casa são seus eleitores, mas com certeza a maioria deles. Já a conhecia como especialista em Direitos Humanos, professora e intérprete de libras. O que eu não conhecia era sua tremenda sensibilidade e sua capacidade para a compaixão. Não conhecia sua militância, não só longa, mas, segundo pessoas ligadas a ela, de muita qualidade. A candidata Claudia Furlanetto vem dos movimentos sociais, vários deles e esses movimentos a acompanham com emoção. Hoje almoçamos com ela e pude ouví-la pela primeira vez, falando de suas intenções e de suas idéias. Fiquei engasgada por duas vezes, chegando quase às lágrimas. O ponto alto de discurso foi quando, com simplicidade, falou de sua visão sobre a inclusão. Disse que não temos que normalizar as pessoas, mas aceitar que há pessoas com uma perna só, há as que não têm nenhuma perna, há os cegos, os surdos e todos somos o que somos. Nossa cidade é que deve ser cuidada de uma forma que contemple todas as pessoas, para que todas as pessoas possam usufruir do que a cidade tem a oferecer. Segundo ela, foram elaboradas cinco cartas de intenções e uma delas foi lida em braile por um cego durante o almoço. Estou reproduzindo a seguir essa carta que achei a cara da candidatura. Tenho orgulho do que reputo ser uma candidatura que serve de porta-voz para tudo o que penso seja essencial para nossa humanização. Poucas vezes tive tantas certezas em um meio em que isso é quase impossível. Cláudia, orgulho-me de ser sua eleitora, assim como me orgulho de me considerar sua amiga. Parabéns pelo texto que reproduzo a seguir:

"Não vendemos sonhos e nem compramos desejos...Não vendemos o sonho da educação de qualidade, buscamos nos qualificar;Não vendemos o sonho da saúde, cuidamos do meio ambiente;Não vendemos o sonho da justiça, agimos corretamente;Não vendemos o sonho da inclusão, conquistamos os espaços;Não vendemos o sonho da liberdade, respeitamos o espaço do outro;Não vendemos o sonho do trabalho, acreditamos na capacidade de cada um;Não vendemos o sonho da sociedade igualitária, reconhecemos as diferenças;Não vendemos o sonho da Paz no mundo, semeamos o amor; Não vendemos o sonho da ética, temos coragem para falar a verdade.Não vendemos sonhos e nem compramos desejos...Simplesmente porque acreditamos que se sonharmos juntos nossos desejos serão saciados a partir das nossas ações, e os nossos sonhos continuarão, a cada dia, sendo do tamanho exato da coragem, da força e do comprometimento de cada um de nós."Claudia Furlanetto

sábado, 27 de setembro de 2008

Manuela D'Ávila


Gosto de citar mulheres fortes que se impõem femininamente. É o caso de Manuela, a candidata a prefeita de Porto Alegre. Ela é linda, charmosa como poucas mulheres conseguem ser, mas não se vale de seus atributos físicos para conseguir seus intentos. Em entrevista concedida a todos os candidatos a prefeito da capital pelo jornal Zero Hora, ao chegar sua vez no dia 25 próximo passado, Manuela fez bonito, como sempre. Como exemplo, cito a pergunta de Paulo Sant'Ana à ela: "Tu acreditas que a tua beleza vai ajudar a te fazer prefeita de Porto Alegre, apesar da tua pouca idade?" A resposta veio ligeira, ferina, inteligente: "Apesar da pouca idade, Sant'Ana? Não acho que é apesar da minha pouca idade. Eu ironizo. Como fui obesa, tenho uma felicidade particular em ouvir elogios. Não sou nenhum padrão estético. Significa que talvez a gente estimule as meninas a tomarem menos anorexígenos. Sou a candidata que menos mudou esteticamente, estou igual. Não faço nenhuma transformação em foto ou em TV. Primeiro, acho que é uma besteira essa pergunta, segundo, porque ela é machista. Nunca ouvi essa pergunta para nenhum candidato a governador ou a prefeito de Porto Alegre. Esse é o problema, e não o elogio em si. É uma pauta que certamente amanhã tu não vais perguntar ao Fogaça. E isso é lamentável. Em pleno 2008 tenho de responder isso. É o mesmo problema com relação a minha idade. Por que ninguém pergunta para o Bill Gates, que com a minha idade já era multimilionário?"

Paulo Sant'Ana não é bobo, nem acredito que seja machista. Ele vive em um meio em que se aprende muito, em que se ultrapassa o estágio de estar julgando as pessoas pela aparência, pela orientação sexual, pelo que veste. Acredito que a pergunta foi formulada para ajudar Manuela, só pode ser isso. Agora, posso estar enganada, pois há pessoas que não aprendem, que, mesmo ficando velhos, mesmo estudando e lendo, conservam aquele ranço, aquela coisa que julga, que pré-julga, o que é pior. Quem não conhece os que falam mal dos jovens DE HOJE, das músicas DE HOJE, dos bailes DE HOJE, pois para eles as coisas do passado é que eram boas. São os preconceituosos e saudosistas, geralmente são dogmáticos e extremamente religiosos. Paulo Sant'Ana não faz o perfil, de jeito nenhum. Há outra possibilidade para a pergunta infeliz: ele pode ter simplesmente pisado na bola com Manuela, a exemplo do que todos nós fazemos de vez em quando e depois procuramos um buraco pra nos esconder. De qualquer forma, foi uma péssima pergunta, que de tão péssima permite que o interlocutor deite e role na resposta. Dá-lhe Manuela!

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Violência contra crianças e adolescentes


Participei ontem na UPF da VI JORNADA ESTADUAL CONTRA A VIOLÊNCIA SEXUAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES. O intuito da audiência pública era o de sensibilizar principalmente o público acadêmico, futuros profissionais que trabalharão pela sociedade, a fim de que se mobilizem e tenham um novo olhar sobre a violência cometida contra criaças e adolescentes. Certamente que, conhecendo a realidade e sensibilizados, todos tratarão de construir uma vida melhor para todos.

A Dra Joelza Mesquita, médica pediatra da Sociedade de Pediatria do RGS e do Serviço de Proteção da Criança e do Adolescente da ULBRA mostrou-nos slides de crianças abusadas, contou-nos fatos dramáticos sobre crianças e adolescentes que sofreram violência sexual por parte de adultos. Um dado chocante é o de que, na maioria dos casos o agressor é um adulto significativo na vida da criança, o pai ou o padrasto. Sentiu-se que a platéia estava estarrecida e que a maioria nunca imaginou que uma em cada quadro meninas sofre alguma forma de abuso, e um em cada 6 meninos também. São dados estatísticos que refletem uma realidade dura de se encarar. A Dra. Joelza trabalha há 22 anos com crianças abusadas e não escondeu a dificuldade que ainda tem em lidar com crianças vitimizadas, com o nó na garganta que sente quando ouve suas histórias, seu choro, e detecta suas sequelas, suas mutilações. Ela não escondeu o fato de que dificilmente alguém que é abusado volta a ser o que era e, segundo sua constatação, muitas mães que encaminham seus filhos abusados para ela, sofreram no passado agressão parecida e não conseguiram maternar, não conseguiram defender seus próprios filhos de serem abusados.

Segundo a Dra. Joelza, deve-se cuidar dos pais para que eles consigam desempenhar seu papel, que é o de amar e proteger de forma adequada os filhos.

A seguir Mariza Alberton, Coordenadora do Movimento pelo Fim da Violência e Exploração sexual de Crianças e Adolescentes falou-nos sobre a exploração comercial de crianças e adolescentes. Contou sobre a CPMI (comissão parlamentar mista de inquérito) que investigou a exploração de crianças,da qual ela fez parte como investigadora. Seu relato sobre o que acontece no tráfico de crianças, com a venda de crianças bem pequenas e, segundo ela, quanto mais pequenas maior o valor comercial, foi de arrepiar. Contou por exemplo que, em Soledade, quando da CPMI, constatou-se que empresários premiavam seus compradores com crianças. Quanto maior a venda, mais novinha a criança oferecida como prêmio. Enfim, foram muitas as denúncias, muitas as revelações, muitas as orientações.

Considero importante frisar que, todos nós membros de uma sociedade, somos co-responsáveis por todas as crianças e não podemos ser omissos com o que está sendo visto problema de saúde pública. O sofrimento das crianças não pode ser minimizado de forma alguma. A criança não é mais um objeto na mão do adulto. O Estatuto da Criança e do Adolescente tornou a criança visível como sujeito de direitos e como prioridade absoluta. Essa prioridade foi muito questionada
pelo deputado estadual Miki Breier, quando falou que a causa da criança não está sendo contemplada pelos orçamentos públicos, que não está sendo possível cuidar adequadamente da criança por falta de recursos e por falta de uma estrutura de apoio, tão necessários para que o ECA seja verdadeiramente implementado.

Foi um evento de peso. Acredito que os acadêmicos e os profissionais que participaram da Jornada saíram muito sensibilizados e dispostos a dar sua contribuição, mesmo que seja só ficando com os olhos bem abertos, a fim de denunciar abusos pelo fone 100, no mínimo.

Escola de Pais do Brasil




No dia 23 deste mês iniciamos um Curso de Aperfeiçoamento e Treinamento para novos casais coordenadores de círculos de debates, assim como, para educadores interessados em realizar um trabalho voluntário voltado à educação. Serão mais 10 semanas de trabalhos, todos nas terças-feiras, às 19.30 no Colégio Notre Dame. A EP realiza periodicamente este curso, a fim de poder atender às demandas locais e regionais, que nos ultimos tempos têm se intensificado. Nota-se insegurança por parte de todos os agentes educadores de crianças e adolescentes, não só dos pais. Estamos diante de uma nova realidade, estamos lidando com situações inéditas e deparamos com falta total de parâmetros e de modelos em quem nos espelhar. A pós modernidade com suas mudanças vertiginosas deixa-nos a sensação de não saber nada, na medida em que nos massacra com informações que não conseguimos sequer metabolizar. Urge parar para pensarmos nossa família. Pensar sobre algo ajuda-nos a organizar mentalmente o que pretendemos fazer. Deixamos de agir por impulso, por instinto para algo mais racional e o mais importante: dá-nos tempo para examinar nossa intimidade, nossos sentimentos. Considero extremamente importante participar de ciclos de debates da Escola de Pais, por ser uma oportunidade de trocar com outros pais as coisas que nos alegram, as coisas que nos afligem. A melhor forma de aprender e de organizar-nos é conversando uns com os outros. Todos gostamos de fazer isso. Aqueles jantarzinhos na nossa casa com amigos, quando comemos e conversamos, bebemos e conversamos, estamos aprendendo, estamos organizando nossa vida para que ela seja mais leve e mais feliz. Diálogo não pode ser uma palavra banal, não pode tornar-se lugar comum. Diálogo é coisa séria e deve carregar em si um compromisso com nós mesmos: o de dizermos uns aos outros que é muito bom sermos diferentes, que é muito bom ouvir de você o que você pode me ensinar e você poder ouvir de mim o que eu posso lhe ensinar. Isso é tête à tête, uma expressão francesa muito chique e que eu adoro!

terça-feira, 23 de setembro de 2008

Ausência física


Quando menina ainda, eu adorava ler os romances de Pearl S. Buck - acho que se escreve assim - uma escritora americana, filha de uma casal de missionários. Pearl conta que moraram na China em missão e lá morreu seu irmãozinho ainda pequeno. Carrie, a mãe de Pearl, não conseguia parar de chorar e de sofrer por causa da perda do filho, ao passo que o pai recebeu a notícia da morte com naturalidade, e a falta não chegou a ser sofrida por ele, já que a alma estaria no céu, aos cuidados de Deus. Carrie que não se conformava, foi sensurada pelo marido, pois, para ele, o menino nunca tinha sido deles, o que eles tiveram foi só um corpo e o que vale é a alma imortal. Ele considerava uma blasfêmia chorar por causa do corpo físico. O relato da romancista acerca do que a mãe falou sobre a ausência do filho nunca me saíram da memória. Segundo a mãe, ela nunca teria sentido o cheiro da alma do filho, nem teria aconchegado a alma junto ao corpo para que parasse de chorar. Ela sentia saudade do corpo do filho e ninguém poderia dizer que isso não tinha importância.

O relato pungente de Pearl me vem à memória em um momento em que tento entender a ausência física, mesmo que provisória, sem sofrer mais do que o necessário. Tento entender o que há de tão importante em ouvir a voz, sentir o perfume, ouvir a respiração. A razão não me basta, não consigo raciocinar o suficiente para encontrar as razões de parar de chorar quando o choro vem aos borbotões, de parar de soluçar quando meu corpo é sacudido violentamente pelos soluços. Tenho que encontrar outras coisas. Tenho que pensar que tudo está acontecendo para o melhor, que tudo vai dar certo, que ... que mãe quer o corpo dos filhos, que mãe quer o cheiro dos filhos, que mãe quer o abraço dos filhos, que mãe quer fazer comida pros filhos, que mãe não agüenta ficar longe dos filhos. Mãe não é egoísta, não. Mãe é isso e pronto! E quando encontramos nosso filho de novo, choramos de novo!

domingo, 21 de setembro de 2008


A postagem anterior trata de algo apaixonante. Pensei sobre ela e resolvi continuar escrevendo sobre o assunto. Se foram as ciências que pela vigilância adquiriram saberes sobre o sujeito, elas determinaram que o diferente não é normal. As instituições consideram a homossexualidade um comportamento anormal, um problema, uma questão moral e a tratam como uma opção por parte do sujeito. Existem novos estudos que provam o contrário. O homossexual não faz uma opção, ele é, assim como sua condição não é um problema moral, embora um homossexual possa ser imoral da mesma forma que um hetero eventualmente pode, e, o melhor, ele não é um anormal, já que provou-se que, em qualquer lugar do mundo, 7% da população é homossexual. Acho que deveriam cessar as piadinhas e as ponderações acerca do assunto, já que ele me parece esgotado. Já se gastou muita energia em cima de um assunto gerador de sofrimento, de discriminação, de violência contra pessoas cujos direitos foram violados por conta da ignorância e da homofobia. Michel Foucault, o filósofo a que me refiro na postagem anterior foi homossexual, filho e neto de médicos que o internaram para tratar do "mal" que o acometia. O que conseguiram foi que Foucault tentou se suicidar mais de uma vez e, por conta da vida que quase todos os gays levam, morreu de aids. A vida que quase todos os gays levam é a vida dos guetos de diferentes, de excluídos obrigados a se esconder e a levar uma vida clandestina e por isso mesmo promíscua. Hoje as coisas estão mudando. Percebe-se claramente uma mudança no julgamento das pessoas, mas ainda temos um longo caminho pela frente. Ainda teremos que ouvir aquelas piadinhas de mau gosto e ainda teremos notícias de gaúchos a cavalo perseguindo um gay em plena passeata de 20 de setembro. As ciências estão nos revelando, pouco a pouco, um ser humano mais verossímil, em cuja cara podemos nos reconhecer com facilidade.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

Big Brother


Texto extraído do Wikipédia: Mil Novecentos e Oitenta e Quatro (título original Nineteen Eighty-Four) é o título de um romance escrito por Eric Arthur Blair sob o pseudônimo de George Orwell e publicado em 8 de Junho de 1949 que retrata o cotidiano numa sociedade totalitária. O título vem da inversão do dois últimos dígitos do ano em que o livro foi escrito, 1948.
O romance é considerado uma das mais citadas
distopias literárias, junto com Fahrenheit 451, Admirável Mundo Novo, Laranja Mecânica e Nós. Nele é retratada uma sociedade onde o Estado é onipresente, com a capacidade de alterar a história e o idioma, de oprimir e torturar o povo e de travar uma guerra sem fim, com o objetivo de manter a sua estrutura inabalada.


Orwell em 1948 preconizou o que estamos vivendo hoje. Temos um Grande Irmão nos observando o tempo todo. Atire a primeira pedra quem nunca se sentiu incomodado com a frase: Sorria, você está sendo filmado, em todo e qualquer lugar. Após raciocinarmos, podemos até ter uma sensação de segurança, mas o que acontece de fato é que não ficamos mais à vontade, por que vigilância é invasão. A não ser que estejamos à margem da sociedade, todos temos números que nos identificam e, se acionados, trazem à baila quanto ganhamos, como gastamos, quais as doenças que temos, quantos processos estão sendo movidos contra e a nosso favor, assim como ondo moramos, com quem, nossa idade e tudo tim tim por tim tim. Não escapa nada. Michel Foucault, filósofo francês do século vinte, formula sua teoria sobre o saber e o poder. Ele diz que a arquitetura das nossas instituições serve para a vigilância, o que corrobora o que Orwell diz sobre o estado onipresente a fim de manter as estruturas inabaladas. Foucault usa uma alegoria para explicar como funciona uma sociedade de controle, de vigilância e por que nossos prédios são construídos como são. Imaginemos uma construção redonda com uma torre de vigia ao centro. O vigia está ou não na torre, isso é impossível saber. A estrutura redonda é formada por celas e nas celas estão trancadas pessoas. As pessoas são separadas de acordo com o papel que desempenham no seu meio, por exemplo: presos com presos, estudantes com estudantes, operários com operários e assim por diante. Por causa da torre de vigia, que pode ter um vigia ou não, todos se comportam conforme o esperado pelo poder. Segundo Foucault é assim que o poder normatiza a vida e diz o que é normal. Diterminar o que é normal é uma questão que me fascina, por que trata do saber e do poder mesmo. O poder constrói instituições, vigia as pessoas que estão nessas instituições (hospitais, escolas, prisões), aprende tudo sobre elas, e assim, o poder diz o que é normal e força as pessoas a agirem como tal. De forma bem simples pode-se entender o que seja o big brother, o que seja uma sociedade de vigilância, uma sociedade do Sorria, você está sendo vigiado.

Puxando tudo isso para o que é reles e rasteiro, temos uma fatia da população que se vale da tecnologia para escancarar sua vida de forma a que todos saibam quando está doente, quando está deprimido, quando não gosta de determinada coisa, quando está com raiva e quer brigar, e, pior, briga mesmo, enfim, esta-se usando serviços para, graciosamente, vigiar e permitir que se vigie sua vida particular. Estamos em uma vitrine, mostrando-nos. Na semana passada vi uma enquete na MTV onde a apresentadora perguntava pras pessoas o que elas fariam se fossem invisíveis. A maioria, veja bem, a maioria disse que assaltaria um banco, que pegaria o que quisesse, que cometeria crimes. Questionados pela apresentadora, muito inteligente aliás, todos eles argumentaram que, se não somos vistos podemos fazer tudo. Por causa desse sentimento é que alguns pensam que câmeras de vigilância sejam necessários e que isso inibe a criminalidade. Eu penso que temos que ser melhor educados, para que eduquemos melhor nossos filhos, para que os valores universais sejam praticados. Um povo civilizado tem direitos e deveres e esses têm que ser cumpridos e efetivados.

O que não pode é ser honesto quando nos convém, ou quando tem alguém olhando, ou com quem merece. Até aí meus bois não puxam!

terça-feira, 16 de setembro de 2008

Saber brincar II


Há atores que se valem de motes pra marcar sua atuação. É o caso do mote tu és Mara, cuja origem desconheço, mas que pegou de fato. Mara significa dizer que algo ou alguém é maravilhoso. Há intelectuais que se gabam em dizer que não assistem TV, que viram determinado programa por acaso, que estavam passando na hora que viram sem querer. São os pseudo intelectuais que abominam o que seja popular, que não dialogam com o povo, tornando-se ignorantes do que esteja acontecendo realmente pelo mundo afora. São os teóricos. Há intelectuais completamente antenados com seu tempo, capazes de rir de situações engraçadas e sabem que, mesmo as baixarias da nossa TV, principalmente a aberta, precisam ser assistidas, para que possam ser criticadas, para que se saiba que tipo de cultura está-se passando para nossas crianças e adolescentes, para o povo, enfim. Há os que primam pela vulgaridade, pela crítica gratuita e barata, não tendo capacidade de auto crítica, quanto mais de crítica social. São os que não se incomodam em usar palavrões, grosserias sem motivo e sem sentido, com o único intuito de chocar por chocar. Reputo esse comportamento como o de alguém que serve de massa de manobra, que fala o que outros incentivam que seja falado e o que outros gostariam de dizer, só que se preservam e se escondem covardemente atrás de um sorrisinho fingido do tipo hihihi. Não vejo problema algum em me divertir chamando alguém de Mara, por que deve-se saber brincar, não é? Vou descobrir quem usa isse mote. Em tempo: não sou pseudo intelectual, assisto TV, só que não tudo e também não sou metida a intelectual, sou alguém que vive intensamente e sei do tanto que tenho aprender ainda, do tanto que tenho que conversar ainda, do tanto que não sei. Enquanto souber que nada sei, estou viva. Que bom!

sábado, 13 de setembro de 2008

Dar-se a devida importância


Hoje fala-se em marketing pessoal - marquetchim segundo Luis Fernando Veríssimo - que significa o esforço que se faz para a auto promoção. Vejo isso com bons olhos, pois, se não nos dermos importância e não tornarmos isso visível, ninguém mais o fará. Um artista elabora espaços na mídia para divulgar seu trabalho, um cozinheiro faz a mesma coisa, isso se quiserem que as pessoas os conheçam e procurem o que têm para oferecer. Todos nós vendemos uma imagem que é cuidadosamente elaborada para que seja oferecida ao mundo. Creio que, quanto mais de bem estamos com o mundo, melhor a imagem que queremos oferecer a fim de vivermos com mais qualidade dentro dele. É legítimo ressaltar qualidades, desde que essas qualidades sejam nossas mesmo, desde que, o que fizermos seja realmente feito por nós. Tudo o que fazemos repercute mais ou menos, conforme a visibilidade que nos dermos: há os tímidos cujo marketing pessoal é também tímido e é lindo quando todos descobrem feitos que estavam lá escondidinhos, mas consistentes; há os exuberantes que gostam de que todos vejam o que fazem, com estardalhaço e o fazem com generosidade para si mesmos, assim como são generosos no reconhecimento aos feitos dos outros; há os que se regozijam tomando para si o que outros fizeram e copiam e imitam e, geralmente, contentam-se em viver vidas imaginárias, quimeras cuidadosamente sonhadas e jamais postas em prática. São esses últimos que puxam tapetes e não conseguem enxergar valor onde ele realmente existe. Não gosto de falsa modéstia, não gosto dos que desmerecem o outro, não gosto dos grosseiros, não gosto dos invejosos, não gosto dos cobradores, não gosto dos que urdem por baixo dos panos e se comportam como cupins ou ratazanas de porão, procurando acabar com as bases que outros construíram. Gosto dos que fazem as coisas e as mostram, gosto dos que sabem elogiar e o fazem com verdade, gosto dos que cuidam da sua boa reputação e da reputação dos outros.

quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Ninho vazio?


Deve haver muitos livros, muita produção científica em torno do que chamam Síndrome do Ninho Vazio, que nada mais é do que aquela dor que a gente sente quando um filho ou filha deixa nossa casa. Não é à toa que a palavra ninho é usada, por que ela traduz o que a nossa casa representa para a todos. Criamos um ninho por que somos mamíferos, e é nele que acomodamos nossas crias e é de lá que elas saem para ganhar o mundo. Perfeito! Seria perfeito se não houvesse essa dor. Não concordo com o que chamam vazio, por que raramente o ninho fica realmente vazio, pois o esvaziamento é gradativo. Quando esvazia mesmo acho que já se está acostumado, ou já se está preparado. Surpreendo-me por escrever no masculino. Será que o faço por que não lembro de ouvir falar em homens com síndrome de ninho vazio? Será que eles não sentem igual? Acho que não, já que eles não deitam com a cria pra amamentar como nós as mulheres fazemos; eles não acordam molhados de leite e com os seios doloridos e pesados, enquanto um bebê chora desesperadamente do lado; eles não levam os filhos para o ninho de madrugada, simplesmente por que lá é o lugar mais seguro e é onde acreditamos poder restaurar dor de garganta, febre, dor de barriga, medo e solidão. Por isso não podemos minimizar a dor de uma mãe que vê o filho ir para a vida, para o mundo. Devemos respeitar isso que é um rito necessário e é uma ruptura saudável, por que, muito do que é saudável é precedido por dor. Estou orgulhosa com a nova fase que estamos inaugurando. Vamos ser três a morar na nossa velha casa, que já abrigou tanta felicidade, tanto riso, tanta festa, tantos planos e que já permitiu que se chorasse, que um cuidasse do outro quando fracassasse, quando caisse. Ela continuará sendo o lugar de todos, pois a casa de papai e mamãe é o lugar para onde sempre podemos voltar, pois é lá que estão as lembranças, é lá que está o amor incondicional. Um lar é algo muito grande e ilimitado, onde cabem os nossos, os que querem ser nossos, os que nascem nossos e são a alegria sempre renovada a encher de sons esse ninho que nunca ficará vazio.

sábado, 6 de setembro de 2008

Overdoses


Eu já me tratei com uma psicóloga e as lembranças que tenho sobre o tempo em que só sobrevivi por causa dela são contraditórias. Há períodos na vida em que vivemos overdoses. Ora somos muito felizes e todos os nossos poros e manifestações revelam isso, ora somos muito infelizes e transbordamos isso de todas as formas, sendo impossível esconder o que nos move, ou o que nos paraliza. Quando entramos em crise de verdade, nosso sofrimento concentra-se no alto do peito, concretamente, podemos pegar com a mão até. Isso é, como disse antes, tão concreto, que colocamos a mão no peito, perto da garganta, para mostrar às pessoas que nosso sofrimento está ali, que precisamos alguém ou alguma coisa para retirá-lo dali. Minha psicóloga tateou em busca da chave dos meus porões e essa busca foi muito sofrida para mim. Todos nós somos um mistério insondável e profundo, havendo clarões reveladores que nos desnudam, mas, temos espaços escuros, que nem nós próprios conhecemos e, penso, que nós próprios escondemos com uma chave que, com o tempo, perdemos. A chave dos meus porões eu permiti que fosse encontrada, por isso estou bem, tranquila de novo. No processo de reencontro comigo mesma, reconheço a competência da psicóloga que por tantos meses conversou comigo, insistiu em assuntos que me fizeram sofrer muito, me colocou de frente a fantasmas e a fantasias criados pela minha imaginação, mas que eu cria verdadeiros. Minha psicóloga me ajudou a me pôr de pé e a olhar minha realidade de frente, com olhos mais generosos, mais lúcidos. Tenho certeza de que ainda há porões escuros, nem todas as portas foram abertas, mas isso é para que eu entenda que sou humana e que nessa condição todos nós sofremos, e somos felizes, e, às vezes, nos tornamos reféns de um sofrimento que não conseguimos ultrapassar sozinhos. Sei que fui salva pelo amor da minha família, pela competência de profissionais que me trataram, mas sobretudo, pela linguagem, esse instrumento poderoso que nos coloca em contato com o outro, que nos coloca em sintonia com o outro e que tem um poder de cura imenso. Dizem que o riso cura. Acredito, desde que seja um riso de pura alegria, por que há a hiena que ri só por rir, bobamente. daí não adianta nada, é só deboche.