quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Hoje o dia foi pesado. Temo que não entendam o que estou sentindo e digam, de novo, que não tenho razão para tristeza, que devo encarar tudo com mais serenidade. Não suporto que me tratem como alguém que não sabe o que sentir, como se fosse possível sentir o que os outros acham mais adequado. Eu estou morando em um lugar que ainda é estranho pra mim. Saí de uma casa que eu contruí, com tudo o que isso implica: conseguir financiamento, negociar com engenheiro (coisa fácil no meu caso, por que meu compadre Fernando é ótimo), contratar construtor, comprar tudo, fazer os pagamentos, correr para a construção com o leite pingando dos seios por haver dado à luz à Flávia, correr de volta pra casa, atender as crianças, pegar as crianças no colégio, no vôlei, no colégio de novo, dar de mamar e, acredite, antes de terminar a casa, estar grávida de novo. Sabes quanto tempo demorou pra construir a casa? Seis meses! Isso mesmo! Mas, imagine o que foi nos mudarmos para a casa nova, linda, sólida, com dez anos para pagar e dívidas previstas para dois anos. Foi maravilhoso, já que a grande sala, dez degraus mais baixa, serviu de campo de futebol para os filhos e os primos por todo o período de dívidas, para só então, comprarmos sofás e tapetes. Tivemos o Cássio alguns meses depois da mudança e seguimos a vida de uma forma extremamente feliz. Tivemos episódios de coqueluche em todos, varicela em todos, cirurgias de extração de amigdalas e aquela carninha no nariz em todos, acredite! As crianças brincaram muito, com terra, água, cachorro, amigos, primos e com avós. Meus pais, quando minha mãe ficou doente foram morar conosco e foi ótimo. A vida com velhos e crianças, quando bem vivida é muito boa. Meus pais adoravam meus filhos e, principalmente, o Domingos, que foi carinhoso, cuidadoso e presente na vida deles. Minhas crianças jamais desrespeitaram os avós, pelo que agradeço até hoje. Enfrentamos tudo o que estava reservado, como doenças, carências, faltas de ar, trabalho pesado, noites em claro, com a cabeça erguida e sem fugir sequer um minuto do que tinha que ser feito. Aos poucos tudo foi se acomodando. Os filhos cresceram, começaram a morar por conta própria, meus pais faleceram e, após trinta e quatro anos, encontro-me sentada no meu quarto, escrevendo, enquanto o Domingos, cansado do dia de trabalho, está deitado no sofá. Daqui a pouco vamos jantar e, com sorte, alguém vai aparecer na nossa nova casa antes de dormirmos. Hoje eu não quero pensar que estou fazendo tempestade em copo dagua, que sou uma pessoa afortunada por que não me falta nada. Quero sentir saudade da minha juventude, mesmo que minha velhice seja feliz; quero sentir saudade da minha casa, mesmo que onde moro seja ótimo; quero ter o direito de chorar sem pruridos e quero dizer com liberdade das minhas dores e das minhas dúvidas, sem que isso seja minimizado por pessoas que se pensam mais sábias do que eu. A vida não foi feita para sábios, mas para pessoas que sentem. Sou perfeitamente capaz de ser feliz, mas não o tempo todo, ou seria uma babaca, ou boba alegre. Eu sinto falta de umas pessoas das quais não tenho mais a companhia, mas não das pessoas que se tornaram, mas das pessoas que eu pensei que fossem e nem de longe fazem jus ao que elas pensam que são. Sofri um processo de tortura nos anos mais vulneráveis da minha vida e por uma pessoa tão medíocre que, cá pra nós, tenho que dar razão a quem diz que o diabo sabe pra quem aparece. Essa pessoa sabia que causaria o estrago que causou, mas acredito na lei de causa e efeito e, cá pra nós de novo, eu não gostaria de ter sido a causadora do sofrimento que ela causou em mim. Acho que não conseguiria dormir o resto da vida, até por medo do retorno. Hoje a coisa tá braba por aqui. Acho que vou tomar um chá, conversar com o meu amado marido, que fica muito preocupado quando estou assim. Daqui a pouco ligo pro Théo e pra Cecília e fico boa de novo. Peço desculpas ao Cássio e à Angélica por choramingar de vez em quando, mas quero que saibam, que estou feliz, muito feliz por saber que, graças a eles, ainda tenho acesso à casa que, tenho certeza, verá uma linda família desfilar por seus cômodos mais uma vez. Ufa!

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Querido Vicente

Estamos aqui, sua irmã Cecília, seu avô Domingos e eu, sua avó. Acredito que não conseguiremos dormir de tão ansiosos pela tua chegada. Amanhã de manhã você vai nascer e encher nossa vida de alegria. Sua mãe estava ansiosa à tardinha e seu pai também. Sua avó Vilma já havia chegado para acompanhar esta noite, dar carinho à sua mãe e estar junto dela quando você nascer. A Rocheli veio de Porto Alegre, onde ela mora com o Bruno, seu tio, para fotografar seu nascimento. Ela é muito boa nisso e é uma tia espetacular. Espere só para ver que colinho ela tem. O Théo adora dormir no colo dela. Aliás, o Théo vai ensinar a você muitas coisas. Ele está com quase dois anos, é malandro e já sabe muitas coisas como: mexer no IPad, no telefone, colocar os dedos nas tomadas, abrir tudo o que encontra fechado, quer dirigir principalmente o fusca do Tio Ricardo. Outro dia ele olhou para a barriga da sua mãe, que estava imensa e pediu para tirar, tirar, tirar a barrigona. Acho que você é um gurizão de tão grande que é a barriga da Vanusa. É uma pena que seu avô Alcides não esteja mais aqui, mas você tem muitas pessoas para te amar, por exemplo: Amanhã eu volto a escrever pra você. Estou muito cansada, meu amor.
Agora já o conheço, Vicente! E você é lindo, saudável, grandão. Dizem que você chorou forte ao nascer e que pesou três quilos e quinhentos e cinquenta gramas, olha só! A Cecília dormiu bem, mas ontem à noite a supreendi chorando muito, por que ela encontrou o presente que você vai dar pra ela e olhou o que era e leu o cartão. Ela estava tão nervosa, que telefonou para a mãe, que a tranquilizou e disse que tu não te importarias com isso. Fiquei emocionada com o caráter que a Cecília demonstrou ter, aliás, isso está acima da beleza e de qualquer outra coisa. Mas, quero contar pra você o que está acontecendo agora, na tua família, na tua cidade, no teu país. O Ricardo é funcionário da Receira Federal, há muitos anos e também dá aulas na Faculdade de Direito da UPF, também há anos e é um homem correto, simpático e bom, extremamente bom. A Vanusa é enfermeira e funcionária do Hemocentro da cidade, muito competente e especialista em sangue. Ela é muito querida por todos que a conhecem, tendo como marca muito forte o sorriso que ela espalha por aí. A Cecília estuda no Colégio Conceição, no quarto ano e adora ler, mexer no tablet, e tem um celular há cerca de um mês, com ship. É uma menina linda, amorosa e feliz e estava louca pra te conhecer. A tata Salete é um amor de pessoa e ficou muito emocionada quando contei que você havia nascido e estava bem. Seus padrinhos são uns amores: Daniele e Jone, Cássio e Angélica são seus tios e agora padrinhos. Ficaram muito emocionados quando souberem que haviam sido escolhidos. Todos ajudaram a arrumar o quarto em que você vai crescer e ser feliz. Você tem muitos outros tios e tias, que vou enumerar aqui: Eliza e Iuri, pais do Théo; Flávia e Paulo, que moram em São Paulo; Bruno e Rocheli, que moram em Porto Alegre; Daiane, Ana e Rudi, que moram em Camboriu. Tens muitos primos também, olha só: Ane e Luis Henrique, Lucas e Théo, com quem você vai aprender muita coisa e com quem vais brincar e ser feliz.
A nossa cidade, Passo Fundo está de aniversário nesta semana, está fazendo 156 anos. Estamos festejando muito, por que é uma cidade em pleno vigor e é um polo na medicina, na educação e em serviços. Temos a Jornada Nacional de Literatura, na última semana deste mês, quando vou lançar um livro no qual há quatro contos escritos por mim, o que me orgulha e alegra muito. 
Peço desculpas por não ter concluído esta carta antes, mas ando muito ocupada, nos mudamos da casa onde vivemos a vida toda e moramos em um apartamento, o que vem ocupando minha cabeça. Preciso imaginar como vou deixar este lugar tão meu quanto o outro. Confesso que às vezes tenho saudades do lugar onde vivemos tantos anos, mas acredito que conseguiremos ser felizes aqui. Contamos com tuas visitas, com as festas do pijama que faremos, com as brincadeiras e pulos em cima da minha cama. O vovô é louco por crianças e, certamente, será tão feliz contigo quanto sempre foi com Cecília e Théo. 
Eu quero oferecer pra ti todo o meu amor, toda a minha dedicação e prometo que, além de mim, terás um vovô que fará de tudo para que sejas feliz. 
Seja bem-vindo, Vicente Rizzo Frosi!
Viva o Vicente Rizzo Frosi!.