sábado, 29 de agosto de 2009

Dez centavos


A afirmação de Rousseau de que somos bons por natureza, ganha corpo no maravilhoso curta entitulado 10 Centavos, pois é uma ode à ética natural de que somos dotados, à qual relativizamos conforme ficamos mais “civilizados”.

O filme trata da trajetória de um menino, que transita por Salvador, começando de manhã e entrando pela madrugada. O menino inicia o dia com uma dívida de 10 centavos, fato que lhe causa uma enorme preocupação. Desenrola-se a partir daí uma corrida contra o tempo, contra a fome, contra o calor, o cansaço e culmina com a cena dele indo deitar-se, ajeitando-se sobre um colchão cheio de gente, sem tomar banho, sem ser recebido por ninguém, no meio da escuridão silenciosa.

O filme permite que se deduza, com tristeza, que criança trabalha ainda hoje, como sempre trabalhou, mesmo que queiramos negar isso. Ele não está em uma carvoaria, nem em uma mina, nem em uma fábrica, nem na lavoura, lugares comuns de se encontrar crianças trabalhando, mas está na rua lavando carros, guardando-os enquanto isso, vendendo flores e tentando sobreviver aos perigos que uma cidade oferece a qualquer pessoa. Deduz-se também, que ele é um menino bom por natureza, pois é evidente seu empenho em ser correto com as pessoas, em pagar os dez centavos que fica devendo aqui e ali.

O que comove é o comportamento ético escancarado de um menino que não sorri, não brinca, não come direito e, pelo jeito, não estuda. Nos é familiar o comportamento dos adultos, que o tratam com cortesia, mas com uma evidente indiferença, como se fosse natural haver uma criança solta pelas ruas, trabalhando e pegando um trem de madrugada. No seu jeito de chamar as pessoas de tio, transparece algo corriqueiro e familiar, como se ele estivesse acostumado àquela vida.

O filme convida-nos a refletir sobre o que é ser civilizado, e, sobretudo, sobre nossa atitude condescendente frente à condição vivida por milhões de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social. Mostra-nos alguém que não tem condições de ser criança, já que não vai à escola, não senta à mesa para comer com a família, não tem uma cama para si, não tem tempo para brincar, não há ninguém que o proteja, ninguém que converse com ele, a não ser os que eventualmente se disponham a isso na rua.

10 Centavos pode ser encontrado nos sítios www.portacurtas.com.br ou no www.youtube.com.br. Quem o assiste fica meio desconfortável, ao mesmo tempo tomado de compaixão por todos os meninos e meninas privados de seus direitos fundamentais. Imperdível!

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