quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Impor dor faz as pessoas piores


As sociedades protetoras dos animais têm muito a nos ensinar. Ensinam-nos, por exemplo, que não é necessário promover dor nos abatedouros de animais de corte e que devemos investir em métodos para a matança, que sejam rápidos e indolores. Este cuidado é estendido também aos animais domésticos, com os quais a crueldade, com o intuito de adestrá-los, deve ser banida.
Os argumentos que usam para tanto são poderosos e esclarecem que medidas contra a crueldade e a dor provocadas por nós humanos, melhoram nossa condição de seres racionais, em evolução, tornam-nos melhores e sensíveis para o belo e para o bom. Não nos faz bem conviver com o sofrimento desnecessário e, pior, provocado por nós mesmos.
A situação do Presídio Central de Porto Alegre, retratado em ZH de domingo, remete-nos a uma situação de extremo sofrimento por parte das pessoas confinadas, para as famílias que as visitam, para os funcionários impotentes diante da indiferença e da falta de recursos por parte do Estado e para as autoridades sensíveis à situação. A pocilga em que o presídio se transformou ofende nossas humanidade e cidadania, enquanto cidadãos e seres humanos. Sentimo-nos envolvidos pela dor de pessoas que, ainda que autoras de crimes, devem ter como pena somente a privação de liberdade. O que se acrescenta de sofrimento à segregação constitui crime. Indignamo-nos também com a insalubridade e a insegurança a que estão submetidos os trabalhadores das casas prisionais.
Se usarmos a lógica de que a dor não educa, que causar dor a qualquer ser nos torna piores, então estamos todos cobertos de culpas causadas por permitirmos que problemas graves como o do presídio nunca sejam solucionados, por querermos, como diz Marcos Rolim, “mais do mesmo”, isto é, por querermos mais prisões, mais depósitos para desrespeito aos elementares direitos das pessoas, quando deveríamos empenhar nossos esforços, nosso talento e capacidade de mobilização, no sentido de promover o cuidado efetivo com as crianças, impedindo que sejam maltratadas, tendo a coragem de dizer com todas as letras que em criança não se bate, mesmo que seja de leve; da mesma forma, deveríamos nos insurgir contra as práticas de tortura tão comuns dentro das instituições prisionais, delegacias, orfanatos, escolas e, principalmente, dentro das famílias. Também, deveríamos cuidar de tudo e de todos como se tudo e todos fossem nossos, o que não deixa de ser verdade, já que tudo nos afeta, tanto o que é bom, quanto o que é ruim. Essas são medidas profiláticas que podem começar uma nova construção, uma nova racionalidade, capaz de melhorar a condição humana. Nossas opiniões devem ser orientadas para o crescimento das pessoas e, governantes e gestores na área da segurança pública, devem nos ouvir e prestar contas do que fazem, pois, mesmo leigos, temos direito à insurgência e à indignação.
Publicado no dia 21/11 em www.ifibe.edu.br

2 comentários:

Adriana Gehlen disse...

eu não reclamo dos 'laços' que eu levei quando criança. me fazia ter medo e respeitar. achei bom, tava errada mesmo.
mas quando adolescente, aos 12 anos, fiquei puta da cara ao levar umas chineladas da mãe, só por reclamar do machismo, nossa, nunca fiquei tão revoltada. desde então decidi que nunca mais ia calar a boca diante dessa merda.

Anônimo disse...

Gostei, mãe, mto sensível. Tomara que o teu trabalho renda frutos e logo. O respeito pelo outro e a coerência são mais do que suficientes para a convivência pacífica. Com isso a gente pode dispensar, tranquilamente, métodos que causem qualquer tipo de dor.
Bjo e saudade. Flávia