segunda-feira, 15 de novembro de 2010

A difícil adolescência

Confesso que não gostaria de ser adolescente, mesmo sabendo que estaria em meu pleno vigor, com muitos anos pela frente para realizar sonhos. Ter sessenta e três anos me parece ser mais fácil do que ter dezessete ou dezoito.

Ouço muitos comentários por parte de pais e professores, assisto às notícias, leio jornais e chego à conclusão de que nossos jovens estão sendo extremamente prejudicados, pois lhes negamos seu passado, seu presente e seu futuro.

Fazemos isso quando lhes falamos que nossa infância foi muito melhor, pois andamos de carrinho de lomba, brincamos livremente pela rua, exploramos mato, rios e mares. Não nos furtamos de emitir nossas opiniões acerca da infância deles reprovando o videogame, os sites de relacionamento, as conversas no Messenger. Quando o assunto é música, então, a coisa fica pior. Nossas músicas tinham mais graça, dançava-se junto, o ritmo e a letra eram coisa que presta. Abominamos o fato de terem trocado o dançar junto pelo ficar junto, por terem trocado o caderno questionário com uma pergunta por página – horror das mães – pelo Orkut. Tudo o que fazíamos era muito melhor do que eles fazem, veja só!

Quanto ao presente, não aceitamos que eles consigam aprender em meio ao barulho, que façam muitas coisas ao mesmo tempo e com uma rapidez incrível. Queremos que eles aprendam de bom grado, sentadinhos por horas, em silêncio, bebendo da sabedoria dos professores. Eles teimam em aprender do seu jeito, teimam em questionar os comandos e não conseguem obedecer sem que tenhamos que dar mil explicações antes.

Com relação ao futuro, mostramos um mundo que desmontamos, onde promovemos guerras mundiais, territoriais, religiosas. Cometemos genocídios ainda hoje, mostramos pedófilos, terroristas, queimadas, num festival de tolices feitas por poderosos adultos. Nós somos adultos genocidas, suicidas e cheios de razão, questionamos meninos e meninas que, vendo todo esse descalabro, tratam de viver intensamente o momento presente, por ser impossível vislumbrar um futuro viável.

Não seria mais sábio se olhássemos para nossos adolescentes e tirássemos lições do que estamos causando? Sabe-se que o comportamento irreverente da juventude é uma característica e uma marca da própria condição adolescente e infantil; sabe-se que há um modo novo de aprender que ainda não entendemos, mas existe para quem tem olhos de ver; sabe-se que nossa autoridade está sendo questionada, justamente por causa das bobagens que fazemos, protagonizando escândalos de corrupção, envolvemo-nos em falcatruas amplamente noticiadas pela mídia.

Agora, como diriam nossos filhos: Fala sério! É possível ter uma adolescência saudável, se tudo o que se faz está errado? É possível projetar uma vida longa se tudo o que é mostrado está desmoronando? É possível confiar em adultos que exigem que se viva hoje, como se viveu ontem?

Nós os adultos temos que pedir desculpas por apresentarmos um mundo onde o passado foi melhor, o presente é feio e o futuro á catastrófico. Melhor seria se mostrássemos a caminhada da maioria que é honesta, trabalhadora, empenhada em melhorar a vida das crianças, dos jovens, dos velhos. Melhor seria se compreendêssemos que vivemos uma nova era, na qual a família tem um novo papel, que é o de cuidar melhor, que é também o de promover a autonomia dos filhos, sem desqualificá-los, ajudando-os a ver o mundo em permanente evolução, sem saudade de tempos em que éramos comandados de todas as formas, tanto em casa, como nas ditaduras que sofremos.


Publicado no Diário da Manhã de 2 de dezembro de 2010

Publicado como Tema para Debate em Zero Hora de 26/12/2010

4 comentários:

Carolina Zimmer disse...

Su, como sempre seus textos provocam em mim um turbilhão de ideias!!! Sempre me pergunto se meus filhos, se um dia eu os tiver (minha mãe costuma dizer que faço parte da geração sem filhos, rs), escutarão Beatles e Rolling Stones, nesse intercâmbio de gerações, como foi entre a minha e a sua. Imagino que não. Estamos vivendo uma daquelas fases sociológicas em que uma geração distancia-se abruptamente da outra, como foi entre a sua e a de seus pais.

Sueli disse...

Está aí uma reflexão interessante. A minha geração foi extremamente criticada. Fomos chamados de comunistas, boleteiros, cabeludos e nós reagimos nos desprendendo muito cedo dos nossos pais. O que é estranho é o fato de que os adolescentes de hoje não reagem, vão ficando em casa, mesmo sendo desqualificados. São muitas coisas pra pensar. Vamos continuar a discussão?

gabi disse...

Sueli, fiquei muito feliz com sua visão. Concordo com essa opinião, acho muito triste como se tenta desqualificar a infância de hoje. Claro, existem às vezes os exageros, o consumismo excessivo, aspectos talvez não-benéficos - mas são características da infância atual, e não acho que isso tire também as potencialidades dessa nova infância. Sempre vou lembrar com carinho das coisas que marcaram a minha, mas isso não a faz mais interessante ou "correta" do que a das crianças de hoje.
Continue com os excelentes textos!

Sueli disse...

Obrigada Gabi! Amo os teus comentários.