quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Ah, as mulheres!

“Antigamente (isto acontecia antes do Cristianismo), depois do casamento, o homem tinha o poder sobre a vida e a morte de sua esposa. Ela não poderia recorrer a nenhuma lei contra ele: ele era o único tribunal e a única lei para ela.” ...”algumas pessoas têm consciência da enorme infelicidade produzida, até mesmo nos dias atuais, pelo sentimento de uma vida desperdiçada.” Stuart Mill – A Sujeição das Mulheres (1869)

Stuart Mill escreveu a obra na esteira de um movimento do final do século XVIII, fruto da Revolução Francesa. A partir daí houve muita produção intelectual, elaboração de leis em favor das mulheres e, mais importante que isso, propiciou uma mobilização por parte das próprias mulheres pela sua emancipação e pela equiparação de seus direitos em relação aos homens.

Pois, esta semana, vê-se mulheres exigindo o fim da violência contra elas, mostrando que o espírito retratado na frase de Mill continua norteando nossas relações de gênero.

Ao reivindicarem horário integral para o funcionamento da delegacia da mulher, e não uma delegacia de mentirinha, um centro de ajuda, cursos profissionalizantes para que as mulheres se tornem autônomas e aptas a viver sem seu agressor, abrigo seguro para as que corajosamente fazem denúncia contra seus companheiros, equipe que as ampare e cuide para que recobrem sua auto estima, elas estão exigindo os direitos já há muito positivados, inclusive obtiveram a maior conquista social sobre o tema, a promulgação da Lei Maria da Penha.

Comove-nos a proposição dessas intrépidas mulheres de que os agressores sejam tratados, por acreditarem que eles mesmos estão doentes. Só mulheres engajadas, bem informadas e tomadas de um profundo senso de humanidade, são capazes de enxergar o que para o senso comum é um paradoxo. O senso comum vê na punição a única forma de corrigir os crimes e os erros cometidos, mas, existem muitas pessoas que compreendem que o ser humano merece ser cuidado em sua integralidade, merece ter a chance de corrigir seus erros e de ser educado de forma adequada para que, com uma nova visão de mundo não volte a fazer vítimas. A punição por si só não educa, mas reproduz a violência.

As reivindicações das mulheres que lutam pelo fim do silêncio, pelo fim da indiferença, pelo direito inalienável que todas as pessoas têm a sua integridade física não são difíceis de serem atendidas. Desde a Revolução Francesa (1789) já aprendemos muita coisa, só não aprendemos a usar o dinheiro público para o bem estar das pessoas, só não sabemos salvar pessoas com nossas leis, mas protegemos muito bem o patrimônio.

Nossa solidariedade para com o Movimento de Mulheres é pouco. Devemos também educar nossos meninos e meninas de forma a termos lá adiante a concretização dos ideais: Liberdade, Igualdade e Fraternidade, tão caros à Revolução Francesa. Ver fotos de mulheres amordaçadas, denunciando que ainda há quem acredite ter dono, e que há quem acredite ser dono de alguém. É de doer!


Publicado em Zero Hora no dia 28/11/2009

Publicado no Diário da Manhã de 01/12/2009

2 comentários:

Anônimo disse...

Poxa tia, adorei! E concordo totalmente que não é só com punição que o problema da violência vai ser resolvido. O indivíduo tem que ter educação, ter os seus direitos humanos realmente cumpridos, aprender um oficio digno. Esse negócio de política criminal de tolerância zero tá com nada. Fora que a prevenção tinha que ser a forma de combate mais utilizada e aperfeiçoada, muito antes de partir para o castigo.

Sueli disse...

Dá para prever que tremenda advogada está pintando aí, Alexandra! Estás no ponto pra ler Foucault, que recomendo como obrigatória para tua profissão. Obrigada pelo comentário.