terça-feira, 23 de setembro de 2008

Ausência física


Quando menina ainda, eu adorava ler os romances de Pearl S. Buck - acho que se escreve assim - uma escritora americana, filha de uma casal de missionários. Pearl conta que moraram na China em missão e lá morreu seu irmãozinho ainda pequeno. Carrie, a mãe de Pearl, não conseguia parar de chorar e de sofrer por causa da perda do filho, ao passo que o pai recebeu a notícia da morte com naturalidade, e a falta não chegou a ser sofrida por ele, já que a alma estaria no céu, aos cuidados de Deus. Carrie que não se conformava, foi sensurada pelo marido, pois, para ele, o menino nunca tinha sido deles, o que eles tiveram foi só um corpo e o que vale é a alma imortal. Ele considerava uma blasfêmia chorar por causa do corpo físico. O relato da romancista acerca do que a mãe falou sobre a ausência do filho nunca me saíram da memória. Segundo a mãe, ela nunca teria sentido o cheiro da alma do filho, nem teria aconchegado a alma junto ao corpo para que parasse de chorar. Ela sentia saudade do corpo do filho e ninguém poderia dizer que isso não tinha importância.

O relato pungente de Pearl me vem à memória em um momento em que tento entender a ausência física, mesmo que provisória, sem sofrer mais do que o necessário. Tento entender o que há de tão importante em ouvir a voz, sentir o perfume, ouvir a respiração. A razão não me basta, não consigo raciocinar o suficiente para encontrar as razões de parar de chorar quando o choro vem aos borbotões, de parar de soluçar quando meu corpo é sacudido violentamente pelos soluços. Tenho que encontrar outras coisas. Tenho que pensar que tudo está acontecendo para o melhor, que tudo vai dar certo, que ... que mãe quer o corpo dos filhos, que mãe quer o cheiro dos filhos, que mãe quer o abraço dos filhos, que mãe quer fazer comida pros filhos, que mãe não agüenta ficar longe dos filhos. Mãe não é egoísta, não. Mãe é isso e pronto! E quando encontramos nosso filho de novo, choramos de novo!

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